Trabalhos Aprovados 2018

Ficha do Proponente

Proponente

    Luiz Fernando Wlian (UFRJ)

Minicurrículo

    Mestrando em Comunicação e Cultura pela Universidade Federal do Rio de Janeiro, sob orientação do Prof. Dr. Denilson Lopes. Graduado em Cinema e Audiovidual pela Universidade Federal Fluminense. Pesquisador no grupo de estudos “Afetos, Gênero e Encenações”. Atualmente pesquisa gênero e estética cinematográficos, articulados à teoria queer. De forma específica, as ressonâncias do gênero musical hollywoodiano no cinema queer contemporâneo.

Ficha do Trabalho

Título

    O estranho que canta: momentos musicais, corpos dissidentes e fraturas

Seminário

    Corpo, gesto e atuação

Resumo

    Momentos musicais, em filmes narrativos, são capazes de promover novas formas de engajamento do espectador. Seria possível, nesses momentos, observar uma fonte de investimento queer? A partir do conceito de “momento musical” (Herzog, 2010), articulado a outros conceitos, busco compreender como “fraturas”, forças disruptivas no corpo fílmico, podem dar vazão a corpos e afetos dissidentes. Para tanto, parto da análise de dois filmes contemporâneos, Shortbus (2006) e Zero Patience (1993).

Resumo expandido

    Músicas são potências afetivas. Atingem os corpos, mobilizam os sentidos, geram outras experiências estéticas. Quando inseridas em uma narrativa, são capazes de deslocar o público de cinema, de forma que os corpos cênicos e fílmicos tocam a superfície da pele do espectador de maneira “outra”. Partindo dessa chave “outra”, busco analisar o momento musical como uma possível fonte de investimentos dissidentes, uma força disruptiva capaz de gerar afetos e potências transgressoras em um sentido queer, em que corpos e gestos “estranhos” fraturam um regime de imagens e sons hegemônico.
    Ao se debruçar sobre o gênero musical hollywoodiano, Richard Dyer (2002) nos diz que esses filmes são capazes de gerar um senso de “utopia”, um preenchimento de fissuras da “vida real”, ao passo que Kenneth McKinnon (2000, p. 40) nos diz que o “poder de ansiar por um lugar melhor, frequentemente expressado em canção e/ou dança, inseridos em […] uma versão apelativa do mundo natural, pode ajudar a explicar a importância do musical para minorias que são marginalizadas em sua experiência social”. Contudo, distanciando-se do clássico e aproximando-se do contemporâneo, este trabalho busca observar de que forma momentos musicais nos filmes Shortbus (John Cameron Mitchell, 2006) e Zero Patience (John Greyson, 1993), ao trazerem corpos e gestos “estranhos”, mobilizam novas formas de afeto e engajamento. Diferentemente dos musicais clássicos – em que a sensibilidade dissidente é lida através, principalmente, dos momentos musicais, que se opõem esteticamente à narrativa heteronormativa – estes filmes contemporâneos já têm incorporados em sua narrativa temáticas queer. Apesar disso, busco investigar como, mesmo tratando de narrativas ditas dissidentes, esses filmes trazem um “algo a mais” em seus momentos musicais, um certo deslocamento em relação às suas próprias narrativas. Ou seja, como os momentos musicais desses filmes podem exibir, de forma mais efetiva, corpos lidos como “estranhos” na contemporaneidade. A questão é: quais as tensões e ambiguidades que os momentos musicais desses filmes podem apresentar, em termos de corpos e encenação, com as imagens e sons preponderantes no âmbito narrativo?
    No intuito de investigar essa questão, desloco o conceito de “fratura” – pensado em minha pesquisa para analisar momentos musicais no musical clássico – para observar esses filmes. Interpreto “fratura” como uma disruptura capaz de promover sensibilidades queer em um corpo fílmico hegemônico e “sadio”. Este conceito é baseado principalmente nos conceitos de “momento musical” (Herzog, 2010), “utopia” (Dyer, 2002; Muñoz, 2009), “afetivo-performativo” (Del Río, 2008), “espectatorialidade gay” (Brett Farmer, 2000), “afeto e atrações” (Baltar, 2017), “afetos queer” (Lopes, 2016), e o conceito de “fracasso” em Jack Halberstam (2011), que pensa o ato de fracassar como a “arma dos mais fracos”, como boicotes sutis a regimes hegemônicos, como potência geradora de novas formas de vida.
    A hipótese deste trabalho, ao escolher esses dois filmes, é de que momentos musicais no cinema queer contemporâneo ainda são capazes de fraturar o corpo narrativo e promover sensibilidades dissidentes específicas. Em um contexto no qual corpos e vivências gays estão cada vez mais assimilados e representados ao gosto de padrões hegemônicos, narrativas sobre esses corpos e vivências também tendem a se aproximar de tais padrões. Apesar disso, momentos musicais, ao trazerem corpos “estranhos”, podem fraturar essa aproximação com padrões hegemônicos, ao negociarem imagens de corpos e formas de vida que, mesmo na contemporaneidade, ainda são marginalizados.

Bibliografia

    DEL RÍO, E. Deleuze and the cinemas of performance. Powers of affection. Edinburg University Press, 2008.
    DYER, Richard. Only Entertainment. London & New York: Routledge, 2002.
    FARMER, Brett. Spectacular Passions: Cinema, Fantasy, Gay Male Spectatorships. Dunham and London: Duke University Press, 2000.
    HALBERSTAM, J. The Queer Art of Failure. Durham and London: Duke University Press, 2011.
    HERZOG, Amy. Dreams of Difference, Songs of the Same: The Musical Moment in Film. Minnesota: University of Minnesota Press, 2010.
    LOPES, Denilson. Afetos. Estudos Queer e Artifício na América Latina. Revista da Associação Nacional dos Programas de Pós-Graduação em Comunicação. Brasília, v.19, n.2, maio/ago. 2016.
    MUÑOZ, José. Cruising Utopia: The Then and There of Queer Futurity. New York: New York University, 2009.