Ficha do Proponente
Proponente
- Alexandre Silva Guerreiro (UFF)
Minicurrículo
- Doutor em Comunicação no PPGCOM/UFF. Mestre em Comunicação pela UFF. Bacharel e Licenciado em História pela UERJ. Bacharel em Comunicação Social (Cinema) pela UFF. Professor Docente I na SEEDUC/RJ desde 1998. Produtor executivo no Cineduc. Diretor, produtor e roteirista de obras audiovisuais. Produtor e Curador de Mostras e Festivais. Coordenador de Produção da 8ª e 9ª Mostra Cinema e Direitos Humanos no Hemisfério Sul e do Inventar com a Diferença, realizados pela UFFe SDH de 2014 a 2017.
Ficha do Trabalho
Título
- VIOLÊNCIA NA ESCOLA – O QUE O CINEMA TEM A VER COM ISSO?
Seminário
- Cinema e Educação
Resumo
- As discussões acerca dos modos como o cinema pode/deve estar na sala de aula contribuem para o debate da violência na escola. Partindo de duas propostas de exibição do filme “Vazante” no contexto escolar, propomos refletir sobre como esta exibição pode ser marcada, por um lado, pela invisibilização das desigualdades sociais, e por outro lado, por uma efetiva contribuição ao combate à violência na escola através dos estudos de recepção (ODIN, 2005) e da dimensão estética do filme.
Resumo expandido
- Para refletir sobre o Cinema a partir do contexto de violência na Educação, é interessante, primeiro, repensar o conceito de violência para melhor entender sua ocorrência na escola. O fenômeno da violência acompanha a história da humanidade e faz parte do processo civilizatório. A violência pode ser efetivada tanto por agentes públicos e órgãos do Estado, quanto por indivíduos e grupos isolados. Segundo Marconi Pequeno (2016), o que há em comum entre todos os tipos de violência é o fato de atingirem o ser humano naquilo que ele tem de essencial: sua dignidade. Violência é, acima de tudo, um dispositivo destinado a “coisificar” o outro.
A escola convive com a violência, seja na invisibilização das desigualdades estruturais, seja na hierarquização entre seus atores sociais, ou ainda na aceitação de certas relações de poder que nos remetem à uma violência simbólica (BOURDIEU, 1989). Pensar o cinema nessa perspectiva nos ajuda a vislumbrar formas de combate à violência no âmbito escolar. Entre utilizar o audiovisual como instrumento ou encará-lo como um fundamento na educação (PRETTO, 2005), podemos estar diante de formas que perpetuam a violência ou, ao contrário, que ajudam a combatê-la.
Um exemplo emblemático dessas possibilidades radicalmente opostas pode ser encontrado no filme “Vazante” (2016), dirigido por Daniela Thomas. Após receber elogios no Festival de Berlim, o filme protagonizou uma das maiores polêmicas recentes do cinema brasileiro ao ser exibido no Festival de Brasília. Durante um debate, a diretora foi duramente acusada de construir uma representação dos negros incompatível com o momento atual, em que se discute a importância das ações afirmativas e da necessidade de encararmos as desigualdades estruturais da sociedade brasileira, formada a partir da violência contra as populações indígena e africana. O filme foi acusado de, através de sua estética e linguagem, “coisificar” o negro, utilizando-o como pano de fundo.
Polêmicas à parte, “Vazante” traz para a cena a relevância dos estudos de recepção (ODIN, 2005) em decorrência das diversas leituras que o filme suscitou. Uma exibição do filme seguindo o que se entende por instrumentalização do audiovisual na Educação apaga por completo as possibilidades de discussão em torno da recepção e das questões estéticas e de linguagem que o filme coloca. Nesse sentido, o mesmo filme, exibido no âmbito da Lei 13.006/14, pode apontar para a experiência oposta, na medida em que convoca a comunidade escolar a refletir sobre o cinema de maneira mais profunda.
Entendemos que a Lei 13.006/14 abre diversas possibilidades do cinema na escola, e acreditamos na organização da comunidade escolar em torno do cinema como uma dessas possibilidades. Nesse sentido, a exibição de “Vazante” contribui para um efetivo combate à violência na escola na medida em que permite refletir sobre a violência a partir de uma análise da estética e da linguagem do filme, promovendo uma reflexão sobre nossas desigualdades estruturais. Por outro lado, sua instrumentalização pode ser lida dentro de um contexto de violência simbólica, no qual as tensões são apagadas, as relações de poder são naturalizadas e as possibilidades de afirmação racial são impedidas na medida em que o filme é reduzido à mera exploração de seu conteúdo, configurando-se, talvez, como um ato de perpetuação da violência social em si.
O cinema e a escola são atravessados pela violência de diversas maneiras. A urgência de uma reflexão sobre a violência no contexto escolar nos motiva a pensar no imbricamento desses universos. As reflexões sobre como o cinema pode e deve estar na escola contribuem significativamente para o debate da violência. A exibição de um filme pode ser marcada tanto pela invisibilização das desigualdades sociais, quanto por uma efetiva contribuição ao combate à violência na escola através dos estudos de recepção e da dimensão estética do filme.
Bibliografia
- AUMONT, Jacques; MARIE, Michel. A Análise do filme. Lisboa: Texto&Grafia, 2013.
BOURDIEU, P. O poder simbólico. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil S.A, 1989.
FRESQUET, A (org) Cinema e Educação: A lei 13006 – reflexões, perspectivas e propostas. Belo Horizonte: Universo Produções, 2015.
MISSE, M. Sobre a acumulação social da violência no Rio de Janeiro. Civitas, Porto Alegre, v.8, n.3, set/dez, 2008.
ODIN, R. A Questão do público: uma abordagem semiopragmática. In: RAMOS, F. (Org.). Teoria contemporânea do cinema. Vol II, São Paulo: Senac, 2005.
PEQUENO, M. Violência e Direitos Humanos. Revista de Filosofia Aurora, Curitiba, v.28, jan/abr 2016.
PORTO, M. Crenças, valores e representações sociais da violência. Sociologias, Porto Alegre, ano 8, n. 16, jul/dez 2006.
PRETTO, N. Uma escola sem/com futuro: educação e multimídia. Campinas: Papirus, 2005.
VANOYE, F.; GOLIOT-LÉTÉ, A. Ensaio sobre a análise fílmica. Campinas: Papirus, 1994.