Ficha do Proponente
Proponente
- Pedro Augusto Beiler de Siqueira Garcia (UFF)
Minicurrículo
- Mestrando da linha de pesquisa Histórias e Políticas do Programa de Pós-graduação em Cinema e Audiovisual da Universidade Federal Fluminense e graduado em Comunicação Social – Audiovisual pela Universidade de Brasília. Atuou na área de cinema e educação em parceria com o projeto Inventar com a Diferença (UFF). Atua também como realizador e montador.
Ficha do Trabalho
Título
- Documentário e ação direta em Ressurgentes e Lute como uma menina!
Seminário
- Cinema brasileiro contemporâneo: política, estética, invenção
Resumo
- Filmes como Ressurgentes (2014) e Lute como uma menina! (2016) evidenciam recentes aproximações e entrelaçamentos entre certa produção brasileira de documentários e militâncias contemporâneas. Pretende-se através de sequências destes filmes pensar como corpos, gestos, falas, ângulos e enquadramentos presentes em imagens de ação direta permitem uma momentânea reconfiguração das relações de poder e ao mesmo tempo indicam rupturas na dimensão representativa dos próprios filmes.
Resumo expandido
- Partindo de duas sequências, dos filmes Ressurgentes (Dácia Ibiapina, 2014) e Lute como uma menina! (Beatriz Alonso e Flávio Colombini, 2016), montadas a partir de imagens produzidas no momento de ação das respectivas militâncias, pretende-se pensar as possibilidades de ruptura com um modelo representativo simultaneamente na política e no cinema. Nos dois trechos analisados são colocadas relações entre militâncias, atuando através do que se chamará aqui de ação direta, e representantes de uma institucionalidade. Em Ressurgentes a presença policial se coloca enquanto mediadora entre os interesses da construtora Emplavi e os militantes do movimento O Santuário Não Se Move, engajados naquele momento na luta contra a construção de um novo bairro de luxo em Brasília que desapropriaria área habitada por comunidade indígena. Na sequência de Lute como uma menina! o tensionamento se coloca entre os estudantes secundaristas, que ocupam a Escola Estadual Fernão Dias Paes contra a reorganização imposta pelo governo do estado de São Paulo, e a diretora da respectiva instituição.
Se o subtítulo de Ressurgentes – um filme de ação direta – aponta para os entrecruzamentos entre ação militante e a ação possível ao próprio filme, também em Lute como uma menina! há entre a luta e as imagens dessa luta uma série atravessamentos. Aproximando a presente reflexão ao que evidenciam escritos recentes de Amaranta Cesar (2017), pode-se pensar esses filmes inseridos em uma atualidade onde certos documentários brasileiros voltam a intensificar as relações entre militâncias, ativismos e a produção de cinemas engajados.
Iremos observar como nas sequências de imagem propostas há linhas que escapam a própria tentativa de organização dos acontecimentos operada pelos filmes em suas cronologias e depoimentos. Entende-se ai uma potencialidade deste cinema militante e é nesse sentido que interessa trazer a ação direta para pensar as sequências a serem trabalhadas. Entenderemos ação direta (GRAEBER, 2009, p.210) como uma forma de engajamento onde não se distinguem meios e fins e onde o ato ou a organização deste ato é já uma materialização da mudança que se quer fazer. Como essas imagens se relacionam com a ação direta e como são afetadas por ela?
Na sequência escolhida de Ressurgentes nos interessa observar como a artificialidade da interpretação do policial-mediador e a forma como certos indivíduos militantes participam desse jogo de cena revelam um espaço de possível destituição da legitimidade das forças do estado. Não são apenas as falas que constroem esse possível, mas a forma como o quadro se configura e a dinâmica dos corpos dentro deste que reforçam a ruptura com papéis bem definidos de estudante-militante, policial-mediador e engenheiro-empresário. Há nessas imagens uma dimensão de performance (BRASIL, 2014) que tensiona uma representação estável e controlada que se apresenta concomitantemente.
Em Lute como uma menina! pretende-se pensar em continuidade com seu gesto inicial de deslocamento das relações poder-corpo (FOUCAULT, 1979) ao reconstruir a trajetória das ocupações focado na experiência de meninas secundaristas engajadas no movimento. Nas imagens aqui trabalhadas, interessa observar como o posicionamento da câmera ao lado dos estudantes encadeado com os gestos destes opera um deslocamento das noções de dentro e fora em um entrelaçamento com a própria ação de ocupar a escola. As grades e muros que separam a escola do que está fora dela tem seus sentidos e representações perturbados por um outro possível para este espaço onde novas formas de comunidade passam a emergir.
Bibliografia
- BRASIL, André. A Performance: Entre o Vivido e o Imaginado. In: PICADO, Benjamim; MENDONÇA, Carlos M. Camargos; CARDOSO FILHO, Jorge. Experiência estética e performance. Salvador: Edufba, 2014.
CESAR, Amaranta. Cinema como ato de engajamento: documentário, militância e contextos de urgência. Revista C•Legenda, Nº 35, p. 11-23. Niterói, 2017.
COMITÊ INVISÍVEL. Motim e destituição agora. São Paulo: n-1 edições, 2017.
GRAEBER, David. Direct Action: An Ethnography. Oakland: AK Press, 2009.
FOUCAULT, Michel. Microfísica do poder. Rio de Janeiro: Edições Graal. 1979.
LEANDRO, Anita. O tremor das imagens: Notas sobre cinema militante. Devires, Belo Horizonte, V. 7, N. 2, p. 98-117, 2010.