Teoria de Cineastas
Resumo
- O principal objetivo do Seminário Temático Teoria de Cineastas é aprofundar uma abordagem de estudo que se preocupa com a renovação das teorias do cinema. Trata-se de elaborar a ideia de teoria do cinema no confronto direto com o pensamento de cineastas, tomando como fonte primária seus filmes, entrevistas, livros e textos em geral. É entendimento do ST que cineastas são todos que, efetivamente, fazem filmes, independentemente de qual seja a função. Neste triênio, pretendemos tanto fortalecer os aspectos metodológicos da abordagem, quanto explorá-la em ato, a partir de trabalhos sobre e com cineastas específicos. A ideia geral da Teoria de Cineastas procura compatibilizar a prática acadêmica com a prática fílmica e o pensamento de quem faz filmes, introduzindo a possibilidade de verter o pensamento expresso de cineastas em conteúdo que tensione as teorias do cinema.
Introdução
- A Teoria de Cineastas é uma abordagem que implica uma investigação do cinema tomando como base tanto as obras audiovisuais de cineastas, quanto suas expressões verbais, buscando propor formulações que venham contribuir para o alargamento das teorias do cinema.
Os principais resultados desse processo, até aqui, e que evidenciam o seu potencial de nucleação, estão na intensa participação de pesquisadores no ST no biênio 2018-2019 e na edição de um dossiê de Teoria de Cineastas na revista “InTexto”. Ao todo, foram 34 submissões de artigos ao dossiê. Ressalta-se também que, do primeiro ao segundo ano do último biênio, a procura pelo ST aumentou de 21 para 30 pesquisadores, provenientes de quatro regiões do país. A demanda reflete o fortalecimento da rede nacional da Teoria de Cineastas, fruto tanto dos encontros de pesquisa, quanto da colaboração realizada junto ao Grupo de Trabalho Teoria dos Cineastas da AIM – Associação de Investigadores da Imagem em Movimento, de Portugal.
No último biênio o ST iniciou a prática de realizar encontros fora da Socine, como forma de estreitar os vínculos de pesquisa entre os participantes. Em 2019, aconteceu o I Encontro do ST Teoria dos Cineastas da Socine, em Curitiba, com a participação de 15 pesquisadores e a presença da cineasta Ana Carolina. Para o ano de 2020, a previsão é de um encontro em Florianópolis, na Universidade Federal de Santa Catarina e, em 2021, na Universidade Anhembi Morumbi, em São Paulo. Para o próximo triênio, o objetivo é fortalecer a presença dos participantes dos últimos encontros da Socine, bem como expandir para as demais regiões do país.
Destaca-se, ainda, dentro das atividades promovidas pelo grupo, a realização de duas entrevistas: uma delas com a pesquisadora Manuela Penafria, idealizadora do GT Teoria dos Cineastas da AIM, que será publicada no dossiê da “InTexto”, e outra com a cineasta Ana Carolina, que está em processo de edição para publicação.
Com relação às pesquisas dos proponentes, destaca-se que se articulam sob uma lógica fundamental para a Teoria de Cineastas: proposições de teoria(s) do/para o cinema a partir de fontes associadas a diferentes cineastas. Bruno Leites utilizou a Teoria de Cineastas como metodologia para investigar a sobrevivência do naturalismo no cinema brasileiro dos anos 2000; Patricia de Oliveira Iuva vem trabalhando com os making ofs enquanto objetos independentes que podem dar a ver atos de teoria sobre o cinema; e Jamer Guterres de Mello investiga o método teórico de análise das imagens desenvolvido por Harun Farocki, caracterizado a partir de um pensamento moldado pelas teorias do cinema.
Para o próximo ciclo, a proposta sofre uma relevante alteração, passando a se chamar Teoria de Cineastas, em vez de Teoria dos Cineastas, como fruto do amadurecimento da abordagem no âmbito da linguagem e suas reverberações para a identidade de gênero e das discussões tratadas nos vários fóruns em que as pesquisas se desenvolvem.
Objetivo
- O principal objetivo do triênio é consolidar a rede Teoria de Cineastas, expandindo às demais regiões do país. Nos Encontros do ST fora do espaço da Socine, que acontecerão em SC (2020) e em SP (2021) há previsão de participação de pesquisadores para além dos estados onde o ST já está fortalecido. Pretende-se estreitar os laços com o GT Teoria dos Cineastas da AIM, estimulando relações de pesquisa entre portugueses e brasileiros. Metodologicamente, buscamos fortalecer a consistência da abordagem do ST a partir da relação entre a perspectiva teórica e o aspecto sensível das imagens e a função do pesquisador na teoria de cineastas. Almejamos seguir experimentando a “entrevista teórica” como instrumento privilegiado em nossa abordagem, promovendo encontro entre pesquisadores e cineastas. Visamos, ainda, a compreensão da Teoria de Cineastas que não esteja necessariamente atrelada a cineastas individuais, mas fruto de coletividades ou de estruturas compreendidas sob diversas modalidades.
Aspecto
- A Teoria de Cineastas (TC) é uma proposta que busca investigar o material fílmico e de registro verbal (textos, anotações, entrevistas, etc.) produzido por cineastas, operando sobre pensamentos e atos de teoria em diversos estágios de formalização.
Outra forma de apresentar a ideia seria chamar de “teoria do cinema a partir de cineastas”, como coloca a pesquisadora Manuela Penafria em entrevista a ser publicada no dossiê da “InTexto” (já citado). Em outras palavras, é buscar naquilo que cineastas oferecem em seus filmes e em suas manifestações, “no” e “sobre” o cinema, subsídios fundamentais para a pesquisa no campo cinematográfico em complemento a subsídios advindos de outras áreas do conhecimento. Cabe ressaltar que compreendemos o termo “cineasta” como todo(a) aquele(a) que participa como criador(a) no processo de realização de filmes, seja na direção, na escritura do roteiro, na fotografia, na direção de arte, etc.
A influência do trabalho de Jacques Aumont (2004, 2008) para a constituição dessa abordagem é, evidentemente, incontornável, embora a opção de Aumont pela pesquisa de textos escritos por cineastas seja algo que não adotamos de modo compulsório. Aumont afirma que, no máximo, os filmes poderiam ser “atos de teoria”, uma vez que a teorização dependeria da linguagem verbal para ascender ao espaço da abstração plena situado além das imagens e dos sons cinematográficos. Algo que, no entanto, não seria um impeditivo para a formulação de enunciados teóricos a partir das imagens e dos sons contidos nos filmes.
A constatação de que os filmes atuam como veículos para o pensamento de cineastas não é recente. Pelo contrário, várias teorias e sistemas epistemológicos, como aqueles elaborados pelos criadores da vanguarda soviética dos anos 1920 ou pelos teóricos franceses do período entreguerras, procuraram dar conta da produção e/ou da leitura de pensamentos expressos nos filmes. Em 1948, o crítico e cineasta francês Alexandre Astruc retomou a questão do pensamento nos filmes, lançando as bases do que seria conhecido mais tarde como a Política dos Autores (BAZIN, 1957), posteriormente desdobrada na Teoria do Autor.
É válido enfatizar que a TC é uma abordagem que não se confunde com a Teoria do Autor, embora possa compartilhar com ela características comuns, como o interesse pela constituição de personas autorais em uma determinada obra fílmica. Mas, para além de artistas do filme – isto é, de autores(as) –, cabe à TC encontrar pensadores(as) na acepção livre do termo e que lancem mão dos mais variados meios que dispõem. Por isso, além dos filmes, são objetos de pesquisa os documentos preparatórios de filmagem, os relatos de produção, as entrevistas, os manifestos, os textos de próprio punho, enfim, toda uma miríade de materiais onde poderiam ser encontrados tanto ideias esparsas quanto pensamentos formalmente construídos, ou mesmo enunciados teóricos sistematizados – como nos escritos de Sergei Eisenstein, um raro exemplo de cineasta-teórico.
Por tudo isso, ressaltamos a importância do(a) pesquisador(a) em todo o processo de investigação no âmbito da TC. Sua atuação estaria condicionada ao material encontrado, (re)trabalhando discursivamente pensamentos contidos em obras de cineastas, ou evidenciando pensamentos latentes, quando lhe couber lidar com um material disperso, inconcluso e, não raro, contraditório. Portanto, a produção científica no campo da teoria do cinema recai sobre as articulações de pesquisadores a partir de cineastas e suas produções.
Alguns eixos de abordagens que consideramos relevantes, mas não exclusivos, para a abordagem da TC são:
– Relações entre a prática teórica e os filmes de um(a) cineasta ou grupo de cineastas;
– Sistematização de ideias de cineastas que existam apenas em estado de latência em filmes, entrevistas, manifestos etc.;
– Teorias e pensamentos sobre o cinema expressos por meio de recursos metalinguísticos em filmes de diferentes tendências, do cinema clássico ao cinema experimental;
– Colaborações e tensões entre cineastas e pesquisadores(as);
– Investigação de filmes como possíveis atos teóricos, incluindo tipologia, práticas, estilos; enfim, todas as questões relativas às considerações do filme como um ato teórico;
– Tensionamentos das possibilidades e limites da TC;
– Proposição de diálogos da TC com outras propostas teóricas relativas ou não ao cinema.
Em última instância, urge uma questão de fundamental importância: o que buscamos nos filmes? Na perspectiva da TC, o confronto com as obras e o pensamento de cineastas é imprescindível, a fim de que o ato teórico seja um ato de criação. Ou seja, a pesquisa não pode transmitir tacitamente o pensamento do cineasta. Há que se fazer teoria no agenciamento com o cineasta, cujo modo de pensar difere do modo de pensar acadêmico. Na esteira dessa abordagem, a investigação científica na perspectiva da TC tem que se preocupar com a criação de teoria(s) do cinema que parta(m) do confronto com as reflexões de cineastas.
Bibliografia
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Coordenadores
- Bruno Leites
Jamer Guterres de Mello
Patricia de Oliveira Iuva