Exibição cinematográfica, espectatorialidades e artes da projeção no Brasil
Resumo
- Ampliando abordagens tradicionais que privilegiam sobretudo o cinema a partir do estudo de filmes e/ou de diretores, esta proposta investe na revisão da história do cinema brasileiro sob a ótica da sala de cinema (agora, portanto, histórias de cinemas) e do mercado exibidor nacional, da recepção cinematográfica e das distintas formas de projeção pré e pós-cinema e aborda pressupostos teóricos que envolvem os experimentos e técnicas que faziam “cinema antes do cinema” (MACHADO, 1997, p. 13). Trata, também, da passagem dos locais improvisados para a exibição de imagens em movimento para os espaços específicos e fixos de projeção, bem como das transformações destes cinemas tradicionais. Segue, ainda, a refletir sobre a relação do espectador com a plateia e o filme nos diferentes espaços de exibição e os diversos meios e linguagens das novas concepções espaço-temporais que possibilitam configurações outras no locus do cinema e projeção visual e/ou audiovisual contemporânea.
Resumo expandido
- Queremos aqui refletir sobre os desafios do presente e futuro imediatos do que viemos a conhecer como cinema através de uma arqueologia das mídias, examinando sua inserção na longa história das práticas de projeção (lanternas mágicas, sombras chinesas etc.); dos espetáculos visuais (panoramas, cosmoramas, mareoramas, entre outros); das salas de cinema (espaços destinados à projeção de filmes); das mudanças no estatuto da espectatorialidade e das novas exigências de interatividade e agenciamento do indivíduo no quadro de uma nova cultura das telas e das tecnologias e estéticas da projeção visual e/ou audiovisual em novos cenários pós-cinema (performances de live cinema e outras poéticas de projeção em tempo real).
Começando sua trajetória híbrida de arte e entretenimento tecnológico nos laboratórios de pesquisas, ateliês, feiras de variedades, parques, salões, galpões e teatros, o cinema consolida sua história (e histórias) nas pequenas ou médias salas, movie palaces ou poeirinhas. Sai das ruas e torna-se mais uma loja nos shoppings centers. Otimiza custos e multiplica lucros nos multiplex e megaplex. Busca alternativas em centros culturais, museus, a céu aberto, em qualquer “lugar”, alicerçado em constantes avanços tecnológicos. Um “outro cinema” emerge. Surgem novas rupturas no hábito cinema (MACIEL, 2009), apontando que a institucionalizada situação cinema não é mais a mesma. O lugar do cinema e os filmes não são mais os mesmos. O cinema extrapola a tela. A tela em transe… metamorfoseia-se. A participação do sujeito, sua subjetividade, torna-se cada vez mais ativa em muitas práticas interativas e intermidiais pós-cinema. Redefine-se o que historicamente constituiu o/a espectador/a.
Em suma, o espaço físico e os fatores que envolvem a experiência cinema vêm sofrendo significativas transformações desde seus primórdios, com radical rapidez em nossa contemporaneidade. Buscamos, assim, discutir as questões inerentes às experiências tidas como pré-cinemas, desde a exibição (incluindo espectatorialidade, salas de cinema e mercado exibidor) até as facetas da arte das projeções contemporâneas.
Privilegiamos a análise dos elementos envolvidos nos distintos formatos de projeção visual e/ou audiovisual na trajetória da exibição cinematográfica brasileira. Contemplamos procedimentos exibidores pré-cinematográficos, tais como a câmara escura, os teatros de luz, os panoramas, as projeções criptológicas e as lanternas mágicas. Tratamos dos princípios constitutivos da exibição de filmes – como a tela, plateia, projetor e projecionista, a arquitetura das salas, a iluminação e climatização dos ambientes, as fachadas e a relação com a publicidade, a inserção dos cinemas no espaço urbano e o exercício de sociabilidades, o surgimento dos movie palaces, as mudanças trazidas pelo cinema sonoro, a concorrência da televisão e o espetáculo imersivo dos formatos panorâmicos (anos 1950), o fenômeno do cinema de arte e de outros tipos de circuitos de exibição, o impacto do adensamento das megalópoles na extinção dos cinemas de rua, os cinemas de shopping e o advento do multiplex, a reformulação dos cinemas com o digital e o 3D; os problemas inerentes ao próprio mercado exibidor nacional, seus primórdios e desenvolvimento, seus mecanismos de regulação e suas relações com as esferas pública e privada. Observamos, também, o impacto da tecnologia e estética dos novos formatos de projeção de imagens e sons na contemporaneidade.
Finalmente, pretendemos melhor organizar e desenvolver o evento pré SOCINE em torno das histórias de cinemas regionais, cujo piloto, lançado em 2017 na XXI SOCINE, despertou e ampliou o interesse local pelas salas e formas de exibição de João Pessoa/PB, envolvendo não só os participantes do ST como de interessados locais e cinéfilos em busca do cinema perdido. Esse impacto nos surpreendeu e motivou-nos a continuar o projeto nas cidades hóspedes da SOCINE. Já estamos trabalhando nesse sentido para o próximo SOCINE, em Goiânia/GO.
Bibliografia
- ALMEIDA, Paulo S.; BUTCHER, Pedro. Cinema, desenvolvimento e mercado. RJ: Aeroplano, 2003.
ARAÚJO, Vicente de Paula. A bela época do cinema brasileiro. SP: Perspectiva, 1976.
DOUGLAS, Stan; EAMON, Christopher (eds.). Art of projection. Ostfildern (GE): Hatje Cantz, 2009.
GONZAGA, Alice. Palácios e poeiras: 100 anos de cinema no Rio de Janeiro. RJ: Record, 1996.
LUCA, L. G. A. Mercado exibidor brasileiro: do monopólio ao pluripólio. In: MELEIRO, Alessandra (org.). Cinema e mercado. SP: Escrituras Ed., 2010. p. 53-69.
MACHADO, Arlindo. Pré-cinemas & pós-cinemas. Campinas, SP: Papirus, 1997.
MACIEL, Katia (org.). Transcinemas. RJ: Contra Capa, 2009.
MANNONI, Laurent. A grande arte da luz e da sombra: arqueologia do cinema. SP: Senac; Unesp, 2003.
SOUZA, José Inácio de Melo. O cinema na cidade: algumas reflexões sobre a história da exibição cinematográfica no Brasil. Mnemocine, 2013. Disponível em: http://www.mnemocine.com.br/index.php/cinema-categoria/24-histcinema/200-resenhafr
Coordenadores
- João Luiz Vieira
JOSE CLAUDIO S CASTANHEIRA
Talitha Gomes Ferraz