Ficha do Proponente
Proponente
- Tomyo Costa Ito (PPGCOM-UFMG)
Minicurrículo
- Doutorando em Comunicação (linha Pragmáticas da Imagem), PPGCOM-UFMG.
Mestre em Comunicação, PPGCOM-UFJF, 2013.
Curso de Direção Cinematográfica na Escola de Cinema Darcy Ribeiro, 2010.
Graduado em Comunicação Social, UFJF, 2009.
Direção dos curtas de documentário Missa 法事 (2012), Quase que só há estrelas (2012), e Dulia (2010).
Assistência de direção dos curtas de ficção A menina que colecionava estrelas (2016),
Casamento (2015), Jonathan (2014), e Três Anos de Júlia (2013).
Ficha do Trabalho
Título
- O espaço de palavra e o lugar do espectador no cinema de Rithy Panh
Seminário
- Cinema e literatura, palavra e imagem
Resumo
- Propomos pensar os procedimentos cinematográficos de Rithy Panh na filmagem e na montagem de seus documentários que buscam um respeito pela fala de seus personagens e pelo lugar da palavra posta no filme e, em consequência, pelo lugar do espectador. Nossa aposta é que o cineasta cumpre uma exigência ética na produção das imagens, defendida por Marie-José Mondzain (2009), que possibilita ao espectador ocupar um lugar de engajamento com o filme, conferindo-lhe maior espaço no uso das palavras.
Resumo expandido
- As palavras, como procedimentos cinematográficos, foram e são largamente utilizadas no documentário: a entrevista, a voz over, e as cartelas constituem-se como principais destes. Ao longo da história do cinema, estes procedimentos vêm sendo deslocados e trabalhados de diferentes formas pelos diretores, tendo modificado as relações entre cineasta e filmados, entre filme e espectador.
Em sua atitude como diretor, Rithy Panh busca que os personagens e os espectadores de seus filmes tenham um lugar para utilizarem a palavra. Durante o trabalho de filmagem, o diretor afirma detestar fazer perguntas, o que lhe interessa é criar situações para desencadear a palavra. “Se eu faço o carrasco se sentar ao lado de 4.000 documentos de arquivo, isso muda sua forma de pensar” (PANH, 2103: 93). Neste encontro há o respeito pela escuta do outro: “o câmera deve aprender a escutar em primeiro lugar” (Ibid.: 105). No momento da montagem, dá-se continuidade, e os relatos são mantidos por sequências e não são “picotados”, já que há “um ritmo [das falas dos personagens], que envolve tudo, a palavra e seu sentido, que cria a poesia” (Ibid.: 103). Panh diz escutar, não só às palavras, mas a respiração dos personagens: é preciso “respeitar o fôlego da palavra”. A eliminação dessa respiração, frequente no cinema documental, é realizada pelo uso do plano de corte, que “leva à fabricação de diálogos em off. Essa fabricação é sempre tentadora. É por isso que o plano-sequência é a forma ideal, se o alcançamos” (Ibid.: 106). Se a respiração é mantida, a palavra montada com a imagem ganha outra dimensão, pois “ela não servia para reforçar a imagem; às vezes chegava mesmo a contradizê-la” (Ibid.: 103).
Os filmes de Rithy Panh são resultados de um percurso amplo, em um trabalho de historiador e arquivista na busca de imagens, na escuta atenta de um conjunto de vozes, constituindo um método de elaboração da memória histórica do Camboja (LEANDRO, 2014). Para Mondzain (2009: 72), a “força da imagem é proporcional à potência das vozes que a habitam”. Nesse sentido, apostamos que a relação entre palavras e imagens, em seus filmes, produz uma experiência que define um lugar do espectador marcado por um falar das imagens que se dá na separação entre o “visível e o sujeito do olhar” (MONDZAIN, 2009). Ao pensarmos essa experiência de separação, é preciso considerar que a própria definição de imagem, que Mondzain (2013) propõe a partir de textos dos padres do período bizantino, se estabelece a partir da relação de duas instâncias separadas: o visível e o invisível. Este último é o “lugar do outro na construção de um ‘ver em conjunto’”. (MONDZAIN, 2011). A possibilidade de relação com o outro no cinema se dá pelo uso das palavras pelos espectadores, são elas que estabelecem o invisível e, em consequência, a possibilidade de um ver juntos. Mondzain (2011: 115) – que diz que “renunciar ao tudo é inventar a imanência do invisível no próprio visível”, dialoga com o pensamento de Jean-Louis Comolli (2008) sobre o lugar do espectador que, ao elaborar a impossibilidade do tudo se vê engajado, movimento necessário para o estabelecimento de um processo de simbolização, já que a imagem do cinema é capaz de, “ao mesmo tempo, tensionar e torcer o mecanismo do olhar, incitar o espectador à sua própria transformação crítica, fazer cintilar o invisível como a superfície mesma do visível” (COMOLLI, 2008: 142).
Consciente de suas escolhas, Panh (2013: 82) critica certo tipo de documentário, que chama de “cinema de entrevista” que adota a norma do “naturalismo”, em que “é preciso revelar uma realidade supostamente ignorada pelo grande público, envolvendo o espectador com o apelo de efeitos dramáticos e estéticos”. Segundo o diretor, este estilo documental tem por objetivo comover o espectador com uma denúncia, mas que acaba apenas confortando-o, com pouca modificação de seu lugar que se mantém como um espaço reduzido de troca de palavras das questões e das experiências em jogo no filme.
Bibliografia
- COMOLLI, Jean-Louis. Retrospectiva do espectador. In: ______. Ver e poder. A inocência perdida: cinema, televisão, ficção, documentário. Belo Horizonte: Ed. UFMG, p. 135-142, 2008.
LEANDRO, Anita. A história na primeira pessoa: em torno do método de Rithy Panh. In: 23º Encontro Nacional da Compós, 2014.
MONDZAIN, Marie-José. A imagem pode matar? Lisboa: Editora Nova Ltda, 1ª ed., 2009.
______. Nada, tudo, qualquer coisa. Ou a arte das imagens como poder de transformação. In A República por Vir: Arte, Política e Pensamento para o Século XXI, ed. Leonor Nazaré e Rodrigo Silva. Lisbonne: Fondation Calouste-Gulbenkian, p.103-128, 2011.
______. Imagem, ícone, economia: As fontes bizantinas do imaginário contemporâneo. Contraponto, 2013.
PANH, Rithy. A palavra filmada: para derrotar o terror. In: Catálogo da mostra O cinema de Rithy Panh. Centro Cultural Banco do Brasil, p. 75-109, 2013.