Ficha do Proponente
Proponente
- Tarcisio Torres Silva (PUCCAMP)
Minicurrículo
- Professor pesquisador do Centro de Linguagem e Comunicação da PUC-Campinas. Docente do mestrado interdisciplinar em Linguagens, Mídia e Arte. Doutor em Artes Visuais pela Unicamp, com período de estágio no departamento de Estudos Culturais, Goldsmiths College, Universidade de Londres. Mestre em Artes (UNICAMP), bacharel em Ciências Sociais (USP) e Comunicação Social (ESPM). Autor do livro “Ativismo Digital e Imagem” (Paco Editorial, 2016).
Ficha do Trabalho
Título
- Lifelogging: experiências narrativas do self com câmeras vestíveis
Resumo
- Este trabalho reflete sobre o uso de novas tecnologias portáteis de captação de imagens, com as câmeras de ação GoPro e Action Cam e câmeras de registro frequente do cotidiano, como a Narrative Clip. Com o advento desses aparelhos em escala comercial, cria-se uma estética em rede digital, voltada para a imagem de si, a produção de arquivos, além das experiências com o corpo e o sentido háptico. Como resultado, apresentamos uma melhor compreensão desse tipo de estética visual em ascensão.
Resumo expandido
- Nos últimos anos, uma série de tecnologias “usáveis” (wearable technologies, em inglês) tem sido lançadas para os mais diversos fins. Entre elas, destacam-se braceletes e outros aparelhos voltados ao monitoramento e aprimoramento do corpo e da saúde, fazendo com que os usuários se tornem agentes ativos no controle das suas atividades corporais, com aplicativos e softwares que produzem informações que tornam a atividade corporal possível de ser medida, analisada e aprimorada.
Além disso, é parte das tecnologias usáveis uma indústria crescente de câmeras de foto e vídeo com design diminuto, o que facilita sua fixação em alguma parte do corpo. Essas pequenas novidades mercadológicas vêm trazendo mudanças significativas na forma como imagens têm sido produzidas por uma grande quantidade de amadores que vêm se aventurando no registro das novidades proporcionadas por essas câmeras. Em função da agilidade no compartilhamento e publicação dessas imagens, notamos uma nova estética em rede proporcionada por imagens desse tipo. Uma estética ligada às experiências intensas, cotidianas e triviais, em primeira pessoa, presente nos perfil dos usuários, assim como nos sites de venda desses aparelhos.
Entre elas, estão as chamadas “action cams”, pequenas câmeras que podem ser conectadas ao corpo dos usuários e que fazem registros de imagens de alta definição numa perspectiva em primeira pessoa, ou seja, por estarem acopladas à cabeça ou pescoço de quem filma, tem-se a visão dessa pessoa na atividade em que desenvolve. Vários fabricantes têm modelos que exercem essa função. As mais conhecidas são a GoPro, da empresa de mesmo nome e as Action Cams, da Sony.
Por essa característica, tais câmeras têm sido muito utilizadas no registro de experiências ligadas a atividades ao ar livre e aos esportes radicais, mas seu uso tem sido ampliado para outros fins, experimentais e artísticos. Um fenômeno recente ligado a essas câmeras é o “lifelogging”, ou seja, o registro da vida cotidiana de uma pessoa feito por câmeras e outros gadgets a partir da perspectiva dela mesma. Na Microsoft, a prática deu origem a um projeto de arquivar registros pessoais liderado por Gordon Bell e Jim Gemmell, tendo a vida do primeiro como referência. O experimento deu origem ao livro Your Life, Uploaded (2010).
Dentre os produtos disponíveis no mercado, um dos que mais se aproxima a essa proposta é a minicâmara Narrative Clip (anteriormente chamada de Memoto). Ela pode ser usada pendurada como um colar ou fixada em alguma parte do corpo. É capaz de produzir vídeos e tirar fotos a cada 30 segundos.
Claramente, ao serem postas como mercadorias desejáveis, as pequenas câmeras citadas neste trabalho são vendidas como objetos que potencializam as experiências individuais dos consumidores, seja em suas ações nos esportes e em outras experiências que proporcionam imagens em movimento de alto valor estético/afetivo/cinematográfico ou por meio do registro intenso de suas atividades cotidianas, numa promessa da criação de um banco de dados capaz de mapear, gravar e “perpetuar” as suas experiências vividas.
Esses gadgets valorizam o indivíduo e a exposição da vida privada, sintomas do nosso tempo e da pós-modernidade. Mas, por trás dessas tecnologias móveis, existe também uma ampla rede de banco de dados que dão informações corporais de seus usuários, tais como deslocamento, localização geográfica, batimentos cardíacos, entre outros, como colocam Patricia Flanagan, Despina Papadopoulos e Georgina Voss (2015). Estaríamos entrando num tipo de biopolítica alimentada com a ajuda dos próprios usuários dessas tecnologias?
Bibliografia
- BELL, Gordon; GEMMELL, Jim. Your life, uploaded: The digital way to better memory, health, and productivity. Penguin, 2010.
FLANAGAN, P.; PAPADOPOULOS, D.; VOSS, G. Intimacy and Extimacy: Ethics, Power, and Potential of Wearable Technologies. In: BARTFIELD, Woodrow (edit.). Fundamentals of Wearable Computers and Augmented Reality, CRC Press, 2015.
MANN, Steve; NOLAN, Jason; WELLMAN, Barry. Sousveillance: Inventing and Using Wearable Computing Devices for Data Collection in Surveillance Environments. Surveillance and Society. 1(3), 2003, p. 331-355.
MARKS, Laura. The Skin of the Film. Durham/London: Duke University Press, 2000.
PATERSON, Mark. The Senses of Touch: haptics, affects and technologies. Berg Publishers: Oxford/New York, 2007.
RYAN, Susan Elizabeth. What is Wearable Technology Art? Intelligent Agent, n° 8.1, College Art Association, Dallas, Texas, 2008.
VERHOEFF, Nanna. Footage: Action cam shorts as cartographic captures of time. Empedocles. Volume 5, n° 1 & 2, p. 103–109,