Trabalhos Aprovados 2017

Ficha do Proponente

Proponente

    Geisa Rodrigues (UFF)

Minicurrículo

    Geisa Rodrigues é professora do departamento de Comunicação Social da UFF. Mestre em Comunicação pela UFF e doutora em Letras pela PUC-Rio, publicou diversos artigos e comunicações na área de cinema, literatura, gênero e etnia. Em 2013 lançou o livro “As múltiplas faces de Madame Satã: estéticas e políticas do corpo”, pela EDUFF.

Ficha do Trabalho

Título

    A voz do corpo feminino negro: afeto e ancestralidade em cena

Seminário

    Cinema Queer e Feminista

Resumo

    Na figuração das relações entre mulheres negras em três curtas contemporâneos brasileiros destaca-se a utilização de elementos caros às culturas africanas ancestrais, bem como ao Candomblé, religião afro-brasileira de origem iorubana, o que sugere a potência política de tais utilizações. Ao dar voz e corpo às experiências dessas personagens, os filmes em questão também se aproximam de certa linha do feminismo negro norte-americano, que valoriza a articulação entre teoria e experiência de vida.

Resumo expandido

    Este trabalho se desenvolve dentro do escopo de uma pesquisa mais ampla sobre mulheres negras e audiovisual gestada no ano passado, em 2016. Para a análise serão utilizados três curtas exibidos em 2016 no VIII Encontro de Cinema Negro, Brasil, África e Caribe Zózimo Bulbul: “Vovó Leontina”,de Paulo Rosa, 2014; “O tempo dos Orixás”, de Eliciana Nascimento, 2015; e “Mulheres de barro”, de Edileuza Penha de Souza, 2015. Nos três filmes em questão elementos componentes da cultura negra são resgatados pelos diretores para configurar as ações de coletivos femininos formados basicamente por mulheres negras. A utilização de elementos caros às culturas africanas ancestrais, bem como ao Candomblé, religião afro-brasileira de origem iorubana, sugere a potência política de tais utilizações na figuração de papéis femininos no audiovisual. Por meio de cânticos, da contação de histórias (na condição de griots) e da dança, são criados elementos de resistência que funcionam como elos afetivos entre as mulheres retratadas e ao mesmo tempo sugerem também uma conexão afetiva com o espectador por meio da experiência estética. De acordo com Bâ, os Griots – contadores de história africanos que tinham a função de serem guardiões da memória de determinados povos ou famílias- faziam uma divulgação dessa genealogia meio de celebrações que mesclavam música, dança e encenação. Outra característica dos relatos dos Griots era uma relação peculiar com a cronologia dos fatos e a inserção de fatos heróicos, mitos, lendas, sonhos e toda uma gama de elementos que enriquecem a narrativa, e dão ao relato um caráter mais libertário em termos de mimese. (Bâ, 2003 : 13). Na articulação entre a memória, o registro e os elementos estéticos e corporais ancestrais africanos procura-se criar resistência política ao racismo institucionalizado no Brasil e ao preconceito triplo historicamente dirigido à mulher negra (GONZALEZ, 2016, p. 408 ). Ao dar voz e corpo às experiências dessas personagens, os filmes em questão também se aproximam de certa linha do feminismo negro norte-americano que considera a potência política da experiência de mulheres negras e valoriza a articulação entre teoria e experiência de vida. Destacam-se, neste sentido, os trabalhos de Bell Hooks e Patrícia Hill Collins. Para tais teóricas as relações e trocas afetivas ganham uma dimensão política e emergem como a chave para a libertação da mulher negra :“Numa sociedade onde prevalece a supremacia dos brancos, a vida dos negros é permeada por questões políticas que explicam a interiorização do racismo e de um sentimento de inferioridade. Esses sistemas de dominação são mais eficazes quando alteram nossa habilidade de querer e amar.”(HOOKS, 2010). A discussão e o combate ao racismo institucionalizado pelo viés da afetividade, das relações íntimas e privadas é uma estratégia também adotada por algumas feministas e ativistas negras brasileiras, como Sueli Carneiro, que vê neste tipo de abordagem uma forma mais eficaz de combatermos o mito da democracia racial latino-americana. Com base nessas proposições, este trabalho se debruçará sobre os elementos estéticos e narrativos utilizados nos filmes em questão para dar voz e corpo às protagonistas negras e suas experiências, destacando a potência política de cantos e rituais africanos utilizados como temáticas de produtos audiovisuais. Convém destacar também o papel do curta-metragem como ativador de debates, considerando que diversos realizadores negros têm utilizado este formato para, por meio da exposição e expressão de suas vivências e experiências de vida, levantar discussões acerca do racismo institucionalizado.

Bibliografia

    BÂ, Amadou Hampâté. Amkoullel, o menino fula. São Paulo: Pallas Athena; Casa das Áfricas, 2003.
    CARNEIRO, Sueli. Enegrecer o feminismo: a situação da mulher negra na América Latina a partir de uma perspectiva de gênero. Disponível em http://www.geledes.org.br. Acesso em 9/11/2016.
    COLLINS, Patricia Hill. The Social Construction ok Black Feminist Thought. In: JSTOR.Common Grounds and Crossroads: Race, Ethnicity, and Class in Women´s Live. 4. ed. Chicago: The University Of Chicago Press, 1989. p. 745-773.
    GONZALEZ, Lélia. A mulher negra na sociedade brasileira: uma abordagem político- econômica. In RODRIGUES, Carla, BORGES, Luciana e RAMOS, Tania R. O. , (orgs). Problemas de gênero. Rio de Janeiro: Funarte, 2016.
    HOOKS, Bell. Vivendo de amor, 2010. Disponível em http://www.geledes.org.br. Acesso em 10/08/2016.