Trabalhos Aprovados 2017

Ficha do Proponente

Proponente

    Vinícius Andrade de Oliveira (UFMG)

Minicurrículo

    Doutorando em Comunicação Social pela UFMG, membro do grupo de pesquisa Poéticas da Experiência. Curador do 19º FestCurtas (Festival de Curtas de BH) e do Cineclube Sorpasso (parceria com o Grupo Galpão e o Consulado da Itália em BH). Tem contribuído com revistas, festivais e mostras de cinema brasileiro (Fórum.doc, Revista Continente, CurtaCircuito, MOV). além de participar de ações em audiovisual junto à Ocupação Cinematográfica Elizabeth Teixeira e à Rede Coque Vive (PE).

Ficha do Trabalho

Título

    Rememorar para intervir, intervir para rememorar

Seminário

    O comum e o cinema

Resumo

    Partimos da hipótese de que os documentários engajados que mais sensivelmente abrem suas formas fílmicas aos atravessamentos das lutas sociais travadas nessa década nas cidades brasileiras são aqueles capazes de construir uma legibilidade histórica complexa na abordagem dessas lutas. Analisaremos assim Ressurgentes – um filme de ação direta (Dácia Ibiapina, 2014), com foco em sua articulação entre as temporalidades da urgência e da rememoração, apontando os efeitos dissensuais nele engendrados.

Resumo expandido

    O trabalho parte da hipótese de que, entre os documentários brasileiros engajados nas recentes disputas pela retomada do espaço urbano (ROLNIK, 2013), os que mais sensivelmente abrem suas formas fílmicas aos atravessamentos e tensionamentos das lutas sociais são aqueles capazes de construir uma “legibilidade” histórica (DIDI-HUBERMAN, 2012) complexa na abordagem dessas lutas. Embora dependa de efeitos de sentido presentes nas cenas – da ordem da mise-en-scène (COMOLLI, 2008), portanto –, essa “legibilidade” é alcançada, sobretudo, na articulação entre as cenas e outros materiais, através de operações variadas de montagem, que incidem, por sua vez, na composição geral da narrativa.
    Ao nosso ver, o documentário Ressurgentes – um filme de ação direta (Dácia Ibiapina, 2014) pode demonstrar tal hipótese. Trata-se de uma obra que, combinando um desejo de intervenção e um trabalho de memória acerca das lutas sociais, instala-se no cruzamento das temporalidades da urgência e da rememoração, extraindo notáveis efeitos dissensuais (RANCIÈRE, 2010). O objetivo da apresentação, que integra uma pesquisa mais ampla sobre o cinema recente e as lutas urbanas, é aprofundar essa perspectiva, propondo relações pontuais com alguns filmes dedicados a problemas correlatos, como Por uma vida sem catracas (Carlos Pronzato, 2013), Futuro Junho (Maria Augusta Ramos, 2015) e Vozerio (Vladimir Seixas, 2015).
    Defendemos que uma análise com vistas a esse propósito deve se voltar às operações que, no filme em questão, combinam cenas produzidas em contextos de urgência – ações diretas dos movimentos, denúncia de violência policial, documentação para fins jurídicos – com outras cenas e materiais, como testemunhos, arquivos, informações, fotografias. Interessa-nos assim perscrutar três eixos que amparam o modo como a ideia de legibilidade histórica é aqui empregada: a maneira pela qual o acúmulo de experiências e saberes construídos pelos movimentos sociais ao longo dos anos de enfrentamento diário dos problemas urbanos ganha visibilidade; a maneira como a memória das vidas que se entrelaçam indissociavelmente às lutas é elaborada; e em que medida encontramos correspondências sensíveis entre a forma do filme e as formas de luta dos movimentos retratados.
    Essa investigação adquire especial relevância no contexto de urbanização vivido nas cidades brasileiras nos últimos 30 anos, marcado por uma lógica de desenvolvimento notavelmente submetida aos ditames dos mercados financeiros e especulativos, em que as associações entre estes mercados e os poderes públicos funcionam como uma violenta máquina de apagamento das lutas sociais que, no passado e no presente, a elas opõem outras visões e modos de vida urbanos. Visamos, portanto, não apenas a produção engajada recente feita no Brasil, em sua relação com o espaço da cidade, mas também como esta se conecta a processos históricos mais amplos, que dizem respeito tanto à presença de inflexões políticas no campo do cinema e das artes, como a dinâmicas sociais de maior escala, como a intensificação de conflitos urbanos, manifestações, disputas territoriais etc.

Bibliografia

    BRENEZ, Nicole. Political cinema today: the new exigences – For a Republic of the imagens. Melbourne, 28 septembre 2011.

    CESAR, Amaranta. Ocupar, resistir, ressurgir. In: Catálogo do forumdoc. bh. 2015. BH, Filmes de Quintal/FAFICH UFMG.

    COMOLLI, Jean-Louis. Ver e poder. A inocência perdida: cinema, televisão, ficção, documentário. Belo Horizonte: Editora UFMG, 2008.

    DIDI-HUBERMAN, Georges. Imagem-montagem ou imagem-mentira. In: Imagens apesar de tudo. KKYM: Lisboa, 2012.

    MARICATO, Ermínia. O impasse da política urbana no Brasil. Petrópolis, RJ: Vozes, 2014.

    RANCIÈRE, Jacques. Dissensus. On Politcs and Aesthetics. Londres: Continuum, 2010.

    ROLNIK, Raquel. “Apresentação – As vozes das ruas: as revoltas de junho e suas interpretações”. In: MARICATO, Ermínia et al. Cidades Rebeldes: Passe Livre as manifestações que tomaram as ruas do Brasil. São Paulo: Boitempo Editorial: Carta Maior, 2013.