Trabalhos Aprovados 2017

Ficha do Proponente

Proponente

    Marcelo Vieira Prioste (PUC-SP)

Minicurrículo

    Doutor em Meios e Processos Audiovisuais pela ECA/USP. Atualmente leciona na PUC-SP (Multimeios, Jornalismo, Diálogos entre Filosofia, Cinema e Humanidades e Estética das Mídias). Em 2017 atua como professor convidado no PROLAM-USP (Programa de Integração da América Latina). No doutorado desenvolveu pesquisa sobre as formas narrativas do cinema documentário latino-americano com enfoque na produção do cineasta cubano Santiago Álvarez Román.

Ficha do Trabalho

Título

    Santiago Álvarez: Um Vertov Latino?

Seminário

    Cinema e América Latina: debates estético-historiográficos e culturais

Resumo

    Partindo de um pressuposto nas análises sobre a obra do cineasta cubano Santiago Álvarez (1919-1998) que frequentemente o comparam em termos estilísticos com Dziga Vertov (1896-1954) , um dos precursores do cinema documentário nas primeiras décadas do século XX, esta comunicação baseia-se em pesquisas recentemente publicadas para problematizar este entendimento, destacando distanciamentos e contrastes entre a filmografia e a trajetória do cineasta cubano com a do realizador eslavo.

Resumo expandido

    Frequentemente pesquisadores e cinéfilos em geral comparam a produção do cubano Santiago Álvarez (1919-1998) com a do cineasta Dziga Vertov (1896-1954). Também é comum que, no intuito de enaltecer o primeiro, encontre-se em revistas, sites especializados e diversos outros materiais de divulgação a expressão um “Vertov latino”. O pesquisador inglês Michael Chanan foi um dos autores que parametrizou muitos nessa direção ao comparar a primeira década da produção de Santiago Álvarez com o cinema soviético, dizendo que: “[…] Álvarez amalgamou uma cleptomania criativa com a habilidade de um bricoleur para reinventar a montagem soviética em um cenário caribenho” (CHANAN, 1996, p. 430, tradução nossa).
    Porém, em mais de uma entrevista, quando indagado sobre essas aproximações, o cineasta cubano afirmava só ter tomado conhecimento da filmografia do realizador de Um Homem com uma Câmera (URSS, 1929) no início dos anos 1970 e por isso, segundo ele, “[…] qualquer semelhança é pura coincidência” (ÁLVAREZ apud LABAKI, 1994, p. 41). Mas, de qualquer forma, o cubano sentia-se enaltecido quando comparado a um dos grandes difusores do pensamento bolchevique por meio do cinema na União Soviética, principalmente a partir da década de 1970, com a intensificação dos vínculos econômicos e políticos de Cuba com o bloco socialista.
    Em síntese, ao reconhecer que o cinema mais relevante de Vertov baseou-se em um projeto de “revelação” de uma nova realidade revolucionária a partir de uma dialética entre o captar de imagens do mundo e a posterior montagem, formando um produto intenso, alimentado pela realidade material que estabelecia um novo discurso sobre ela, também o cinema estatal de Santiago Álvarez, feito décadas depois, não se resumiu ao “registro” do real, mas pautou-se pela adoção de procedimento similar, no interior de um contexto fílmico em prol dos ideais da Revolução Cubana em curso.
    Recentes pesquisas, como o livro Post-Revolution Nonfiction Film: Building the Soviet and Cuban Nations, lançado em 2013 pelo pesquisador Joshua Malitsky da Indiana University (EUA), também enfatiza que ambos estavam imbuídos em fazer do documentário a expressão máxima de uma sociedade pós-revolucionária, um dos motivos pelos quais o gênero passou a ocupar um lugar de destaque dentro dos governos recém-instituídos. Contudo, o autor aponta alguns distanciamentos e contrastes, principalmente entre a trajetória do cineasta cubano com a do realizador eslavo no transcorrer dos respectivos processos revolucionários.
    Álvarez seria então um continuador tardio de princípios vertovianos? Talvez parcialmente, pois, se por um lado, contextualmente, ambos confiaram no cinema documentário como uma forma de não apenas singrar por visões de mundo e posturas ideológicas, mas reconhecendo-o como a linguagem legítima deste transcurso. Por outro lado, enquanto a trajetória de Vertov e seu grupo os colocou cada vez mais isolados, conforme foram recrudescendo os valores do stalinismo ao longo da história da URSS, a carreira de Santiago Álvarez manteve-se atrelada ao poder central, particularmente focada no seu representante máximo, Fidel Castro. Por seus filmes ressoam ruídos do processo de centralização de poder, institucionalização e consequente arrefecimento do processo revolucionário, conforme será discutido nesta comunicação.

Bibliografia

    ARAY, Edmundo. Santiago Alvarez: cronista del tercer mundo. Caracas: Cinemateca Nacional, 1983.
    BURTON, Julianne (org.). The social documentary in latin america. Pittsburgh: University of Pittsburgh Press, 1990.
    CHANAN, Michael. New cinemas in latin america. In: NOWELL-SMITH, Geoffrey. The Oxford History of World Cinema. Nova York: Oxford University press, 1996. p.427-435.
    LABAKI, Amir. Olho da revolução: o cinema-urgente de Santiago Álvarez. São Paulo: Illuminates, 1994.
    LABAKI, Luis Felipe Gurgel Ribeiro. Viértov no papel: Um estudo sobre os escritos de Dziga Viértov. 2016. 582 f. Dissertação de Mestrado. Programa de Pós-Graduação em Meios e Processos Audiovisuais, ECA, USP.
    MALITSKY, Joshua. Post-Revolution Nonfiction Film: Building the Soviet and Cuban Nations. Bloomington, Indiana: Indiana University Press, 2013.