Ficha do Proponente
Proponente
- Matheus José Pessoa de Andrade (UFPB)
Minicurrículo
- Matheus Andrade é professor de Fotografia Cinematográfica do curso de Cinema e Audiovisual da Universidade Federal da Paraíba e documentarista. Mestre em linguística, especialista em jornalismo cultural, graduado em Rádio e TV. Publicou os livros Documentário paraibano: modos de representação (2016), Rec: uma iniciação à filmagem (Editora Ideia, 2013) e O sertão é coisa de cinema (Marca de Fantasia, 2008). Áreas de interesse: fotografia cinematográfica, documentário, videoclipe e curadoria.
Ficha do Trabalho
Título
- Luz, sombra, corpos: subversão fotográfica em A morte pede carona
Resumo
- Nossa asserção é sobre a fotografia cinematográfica em A morte pede carona, dirigido por Robert Harmond, em 1986. Apontamos para o trabalho subversivo do fotógrafo John Seale, cujos princípios de fotometria e contraluz na ação de iluminar os personagens principais são reinventados diante de alguns métodos fotográficos. Assim, a atmosfera visual mostra coerência narrativa em meio a outros procedimentos não usuais, corroborando ainda com o entendimento dos filmes B enquanto lugar inventivo.
Resumo expandido
- Nossa incursão consiste em destacar como o diretor de fotografia John Seale apresenta um conceito inventivo e subversivo nas imagens cinematográficas do filme norte americano A morte pede carona (Robert Harmond, 1986), um clássico dos filmes B. Entendemos por filme B aqui os trabalhos de baixo orçamento, com produção independente, diretores estreantes, realizados para complementar a produtividade de alguns grandes estúdios. Esse perfil de produção possibilita o reconhecimento de um lugar experimental para os realizados em meio ao campo industrial.
O trabalho do diretor de fotografia é se responsabilizar pela atmosfera visual de um filme. Escolhe, entre alguns elementos, o estilo de luz que vai aplicar sobre a obra, sobre cada cena e cada personagem, se preciso. A definição do contraste entre luz e sombra implica na dramaticidade imagética. Nesse sentido, dois aspectos nos chama atenção no filme: o lugar de fotometria e a contraluz diurna. Conforme nossas referências, na fotografia existem algumas regras básicas a serem seguintes, tais como: a fotometria deve ser medida no rosto dos atores, pois “(…) é fundamental poder realizar uma exposição correta daquilo que no cinema nos interessa mais: o rosto” (ARONOVICK, 2004, p.32); a contraluz equivale à imagem noturna. “É fácil, é eficaz e realmente já foi usada um pouco demais. Virou uma espécie de convenção: noturna = contraluz” (MOURA, 1999, p.133). Entendemos como conceitos que traduzem fórmulas fotográficas para determinadas situações. Contudo, ressaltamos que os referidos autores destacam que a fotografia é uma atividade criativa e que o limite é a inventividade do fotógrafo, ou seja, regras podem ser rompidas. Assim, Seale materializa uma ruptura a esses dois princípios, oferecendo uma dramaticidade especial sobre os corpos dos personagens do filme A morte pede carona.
Em síntese, Jim Halsey (C. Thomas Howell) está dirigindo um carro em direção à Califórnia em plena madrugada. Sonolento, ele tenta algumas estratégias para manter-se acordado, até resolver dar carona para uma pessoa na estrada. Não sabia ele que o favor feito a John Ryder (Rutger Hauer) seria perigoso, pois ele matava os motoristas que o davam carona. Ao perceber isso em seu primeiro diálogo, dentro do carro, Jim empurra-o para fora, em movimento, e segue seu caminho. Porém, John não o deixa em paz pelo resto da viagem, numa perseguição doentia e quase surreal pela mais lendária rodovia dos Estados Unidos: a Route 66, a qual cruzava o país. No decorrer da perseguição, a trama faz a polícia pensar que o mocinho é o vilão e vice versa, tornando o problema de Jim ainda mais grave. Entre tiros, folgareis e explosões, batidas, capotadas e afrontas face a face, os dois fixam uma estranha relação durante todo o filme.
Nossa inquietação, então, reside sobre o conceito fotográfico do filme, o qual parece romper com o habitual do cinema clássico. Notamos que John Seale não mede a luz nos rostos dos personagens principais, preservando constantemente no filme uma face escura nos dois sujeitos de perfil conturbado. E investe numa contraluz diurna frequente, utilizando o sol como luz principal. Duas soluções de luz dramática fundamentais para estabelecer a atmosfera visual da obra com consistência, a fim de melhor traduzir o perfil psicopático dos personagens principais e da narrativa como um todo.
Bibliografia
- ARONOVICK, Ricardo. Expor uma história: a fotografia do cinema. Rio de Janeiro: Gryphus, 2004.
AUMONT, Jacques. A imagem. 16ed. Campinas: Papirus, 2012.
BROWN, Blain. Motion Picture and vídeo lighting. 2ed. Oxford: Elsevier, 2008.
CINEMATECA VEJA. A morte pede carona. São Paulo: Editora abril, 2008.
LIRA, Bertrand. Luz e sombra: significações imaginárias na fotografia do cinema expressionista alemão. João Pessoa: Editora da UFPB, 2013.
MOURA, Edgar. 50 anos luz, câmera e ação. São Paulo: Editora Senac, 1999.