Ficha do Proponente
Proponente
- Mariana Ribeiro da Silva Tavares (UFMG)
Minicurrículo
- Pós-doutoranda no PPGArtes – Programa de Pós Graduação em Artes da Escola de Belas Artes / UFMG (Bolsa PNPD – CAPES) onde desenvolve a pesquisa interdisciplinar 60 Anos de Memória da Escola de Belas Artes da UFMG – Levantamento, Organização e Reflexão. Doutora em Artes pela EBA – UFMG (2011). Sua tese de doutorado deu origem ao livro: Helena Solberg, do Cinema Novo ao Documentário Contemporâneo (2014), Imprensa Oficial do Estado de São Paulo. Mestrado em Artes / Cinema pela EBA – UFMG (2006).
Ficha do Trabalho
Título
- Vida e morte em “Meu corpo, minha vida” (2017) de Helena Solberg.
Seminário
- Cinema Queer e Feminista
Resumo
- Esta comunicação pretende analisar o mais recente filme da cineasta brasileira Helena Solberg, “Meu corpo, minha vida” (2017) à luz de sua filmografia, tentando identificar, em que medida, ela retoma nesse longa documental, procedimentos de suas fases anteriores. E sobretudo, reitera as personagens e temáticas de sua predileção: as mulheres e questões relacionadas ao seu corpo, à sua liberdade de expressão e posicionamento, neste caso, frente a um tema tabu na sociedade brasileira: o aborto.
Resumo expandido
- O mais recente filme da cineasta brasileira Helena Solberg, o documentário “Meu corpo, minha vida” (2017) reconstitui, num primeiro momento, a trajetória de Jandyra dos Santos Cruz, 27 anos, moradora de Campo Grande, zona oeste da cidade do Rio de Janeiro. Em parceria com a montadora Idê Lacreta, a cineasta investiga o arquivo familiar da jovem – fotografias e imagens de video caseiras – para articulá-los aos depoimentos de familiares (mãe e irmã), amigos e colegas de trabalho. Todos concedem seus depoimentos e muitas vezes, falam no presente. Não por acaso, a montagem evita transparecer se presenciamos o presente ou o passado da personagem.
Essa articulação da montagem remete à produções anteriores da cineasta como ‘Nicarágua Hoje” de 1982, em que é reconstruida a história dos Chevarrías, família nicaraguense que irá conduzir o documentário sobre a Revolução Sandinista no país e à “Carmen Miranda, Bananas Is My Business” (1994), onde o nascimento, infância e juventude da cantora luso-brasileira são reconstruídos também com imagens de arquivo e através das memórias de pessoas que conviveram com a cantora.
A estratégia da montagem em não evidenciar o status da personagem Jandyra na primeira parte de ‘Meu corpo, minha vida”, gera ambiguidade e dúvida. Num crescendo, este procedimento incita a acompanhar a história.
Colabora para o suspense, a resistência dos entrevistados em dar nome ao ato que irá desviar a rota da personagem. Como tantas jovens de classe media baixa em Campo Grande, ela tem sua festa de 15 anos (com direito à vestido de princesa), namorados, amigas, bares e a frequencia aos cultos evangélicos na Assembléia de Deus, levada pela família
A primeira parte do filme é de Jandyra e também da Igreja Evangélica. Quase um tributo à jovem e à Igreja cujo apoio é reiterado pelas imagens e pelas falas de D. Maria Ângela dos Santos, sua mãe e de joyce Liane dos Santos, sua irmã. Ao ponto de nos perguntarmos: será um filme sobre Jandyra?
Mas nas entrelinhas, através do não dito, pressente-se que algo pode acontecer. E diante da recusa dos familiares e amigos em nominar a interrupção da gravidez indesejada de Jandyra (que já tinha 2 filhas: Camille e Caroline) a equipe do filme irá buscar outras vozes e dizeres que possam trazer pistas sobre o “caso Jandyra”: ela recorre à uma clínica clandestina para interromper sua gravidez. O procedimento ilegal resulta numa dupla interrupção: da gravidez e de sua vida. O caso ganha repercussão nas mídias nacional e internacional. Seu nome se torna palavra de ordem nas vozes de ativistas pelas ruas da cidade do Rio de Janeiro em 2014/2015.
Para compreender as implicações do caso – paradigma da situação de milhares de brasileiras que anualmente recorrem às clínicas clandestinas no Brasil, Helena Solberg abre o debate e entrevista Juízes, delegados, escritores, ativistas, religiosos, pastores, médicos e duas jovens que relatam suas experiências com a interrupção de gravidezes indesejadas. É quando começamos a ouvir a palavra “aborto” e sobretudo, a acompanhar o debate sobre o procedimento do ponto de vista jurídico, religioso, ético e moral no Brasil.
O objetivo desta comunicação é analisar o filme tendo como referência, outros trabalhos da cineasta que dialogam com ele, do ponto de vista de estrutura, como os documentários realizados para a televisão pública norte-americana, PBS ( Public Broadcasting System Television ) na década de 1980 e sobretudo, discutir o retorno às questões relacionadas ao feminismo, que marcou os primeiros filmes da cineasta como seu filme de estréia, o documentário em curta-metragem “A Entrevista” de 1966 e a “Trilogia da Mulher”, na década seguinte.
Bibliografia
- Burton, Julianne. 1986. Helena Solberg-Ladd, Cinema and Social Change in Latin America. Austin Texas: University of Texas Press.
Pinto, Célia Regina Jardim. 2010. Feminismo, História e Poder (Dossiê). Revista de Sociologia e Política. V.18, nº 36. Universidade Federal do Paraná (UFPR) 15-23 jun. 2010.
Penafria, Manuela.1999. O filme documentário: história, identidade, tecnologia, Lisboa: Cosmos.
Solberg, Helena. 2017. Meu Corpo, Minha Vida, o filme: seguiremos cúmplices silenciosos de uma chacina? #Agoraéquesãoelas. Disponível em: blogfolha.uol.com.br. Publicado em 30.03.17
STAM, Robert. 2003. Introdução à teoria do cinema. Tradução de Fernando Mascarello. Campinas, SP: Papirus, 3ª edição. (Coleção Campo Imagético).
Tavares, Mariana. 2014. Helena Solberg: do Cinema Novo ao Documentário Contemporâneo, São Paulo: Imprensa Oficial SP.