Ficha do Proponente
Proponente
- Cesar de Siqueira Castanha (UFPE)
Minicurrículo
- Mestrando do Programa de Pós-Graduação em Comunicação da Universidade Federal de Pernambuco (PPGCom-UFPE). Graduado em Jornalismo pela UFPE. Crítico de cinema nos sites Milos Morpha, Cineplayers e Lavoura.
Ficha do Trabalho
Título
- O mal-estar do viajante na Trilogia da Estrada de Wim Wenders
Resumo
- A proposta deste trabalho é analisar os filmes Alice nas Cidades (1974), Movimento em Falso (1975) e No Decurso do Tempo (1976), que compõem a trilogia da estrada, de Wim Wenders. A análise parte de uma observação de como os filmes apresentam a sensibilidade do viajante, e mais precisamente o seu mal-estar de “não pertencimento”. Para pensar esse mal-estar, o trabalho parte dos estudos de John Urry, Susan Sontag, Richard Sennett, Jean-Luc Nancy e Zygmunt Bauman.
Resumo expandido
- A proposta deste trabalho é analisar os filmes que compõem a trilogia da estrada, de Wim Wenders, a partir de uma observação de como os filmes apresentam a sensibilidade do viajante, e mais precisamente o seu mal-estar. Os três filmes são Alice nas Cidades (1974), Movimento em Falso (1975) e No Decurso do Tempo (1976). Todos esses filmes têm como protagonistas viajantes alemães que circulam à deriva e sofrem, cada um a sua maneira, por não pertencerem a nenhum lugar específico.
Este trabalho pretende se debruçar sobre como opera esse “não pertencimento” da figura do viajante nos filmes da trilogia. O objetivo é, também, refletir até que medida o mal-estar se faz inerente ao gesto de viajar. Para estudar essa hipótese, o trabalho parte dos estudos de John Urry, sobre turismo; de Susan Sontag, sobre fotografia; de Richard Sennett, sobre o isolamento; de Jean-Luc Nancy, sobre a paisagem; e tem, como base, o ensaio Turistas e Vagabundos: heróis e vítimas da pós-modernidade, de Zygmunt Bauman.
Em seu ensaio, Bauman evoca dois sujeitos, o turista e o vagabundo, como estratégias de vida pós-moderna para evitar que uma identidade se torne demasiadamente fixa (BAUMAN, 1998, p. 114). Os turistas, nas palavras de Bauman, são aqueles que “realizam a façanha de não pertencer ao lugar que podem estar visitando: é deles o milagre de estar dentro e fora do lugar ao mesmo tempo” e seguem outro caminho sempre que as coisas ameaçam sair de seu controle.
Ainda que respeitando as particularidades de cada filme — entendendo, por exemplo, como Alice nas Cidades trabalha a questão da fotografia de maneira mais específica, ou como o protagonista melancólico de Movimento em Falso se distingue dos demais —, é possível perceber que algumas problemáticas e abordagens estéticas são comuns aos três filmes. O isolamento e a paisagem são algumas dessas questões em comum.
Para Nancy, a paisagem “é a terra daqueles que não têm terra, que estão inquietos e alienados, que não são um povo, que são de uma só vez aqueles que perderam o seu caminho e que contemplam o infinito — talvez o seu infinito distanciamento” (2005, p. 57). Na análise dos filmes, deve-se ter em vista o conflito dos personagens, e do cinema de Wenders, com o próprio lugar em uma Alemanha dividida. O distanciamento desses personagens logo se torna isolamento e alienação, que eles buscam contornar em sua empreitada turística.
Em seu estudo sobre o isolamento narcisista, Sennett comenta que o sujeito isolado se culpa, lamentando a incapacidade de “sentir mais” ou de “realmente sentir”, mas, enterrada por baixo dessa autoacusação, está a sensação de que o mundo está sempre o decepcionando (SENNETT, 2014). Essa frustração é marcante nas viagens empreendidas pelos personagens dos filmes.
No lugar de romper o seu isolamento e fazê-los sentir como parte de algo, a viagem parece intensificar a distância entre eles e o espaço por onde circulam. Em Alice nas Cidades, essa distância está muito claramente demarcada pela sensação do protagonista, fotógrafo, diante das fotos que revela. “Nunca mostram realmente o que viu”, ele reclama. Sua frustração poderia ser corroborada por Sontag, que define a foto tanto como uma “pseudopresença quanto uma prova de ausência” e para quem “a fotografia tornou-se um dos principais expedientes para experimentar alguma coisa, para dar uma aparência de participação” (SONTAG, 2004).
O trabalho também está interessado em pensar o que a sensibilidade do viajante, como apresentada pela trilogia, pode trazer adiante como questões que perpassam pela sensibilidade do viajante/turista contemporâneo e o quanto desse mal-estar do isolamento e do não pertencimento está presente na experiência do turista.
Bibliografia
- BAUMAN, Zygmunt. Turistas e vagabundos: os heróis e as vítimas da pós-modernidade. In: ________. O mal-estar da pós-modernidade. Rio de Janeiro: Zahar, 1998. p 106-130.
NANCY, Jean-Luc. Uncanny landscape. In: ________. The Ground of the Image. Nova York: Fordham University Press, 2005. p 51-62.
SENNETT, Richard. O declínio do homem público: as tiranias da intimidade. E-book. Rio de Janeiro: Record, 2014.
SONTAG, Susan. Sobre fotografia. São Paulo: Cia. das Letras, 2004. 224 p.
URRY, John. O olhar do turista: lazer e viagens na sociedade contemporânea. São Paulo: Sutido Nobel, 2001. 231 p.
WENDERS, Wim. A lógica das imagens. Lisboa: Edições 70, 1990. 176 p.