Ficha do Proponente
Proponente
- Fernando Trevas Falcone (UFPB)
Minicurrículo
- Professor da UFPB.
Mestre em cinema pela ECA-USP, com a dissertação A Crítica Paraibana e o Cinema Brasileiro – Anos 50/60.
Organizador de Cinema e memória: o super-8 na Paraíba nos anos 1970 e 1980. João Pessoa: Editora da UFPB, 2013.
Coordenador projeto http://cinepbmemoria.com.br
Participante do Colóquio Internacional de Cinema Documentário com a comunicação Cinema engajado: a temática social como marco da produção paraibana dos anos 60, 70 e 80. João Pessoa, 2016.
Ficha do Trabalho
Título
- Canto do Mar, canto da terra: Cavalcanti na obra de Linduarte Noronha
Resumo
- Crítico do jornal A União, Linduarte Noronha apontava Alberto Cavalcanti como modelo de realização de filmes voltados para a realidade social brasileira. Desde as filmagens de O Canto do Mar o cineasta era objeto de admiração do crítico.
Textos do crítico sobre a importância de Cavalcanti e aspectos de O Canto do Mar mostram influência deste na formação do pensamento cinematográfico de Linduarte Noronha, que em 1960 realiza Aruanda, seu canto da terra com forte inspiração no Canto do Mar.
Resumo expandido
- Entre 1956 e 1966 Linduarte Noronha (1930-2012) assinou coluna de cinema no diário A União. Um dos intervalos da sua atividade de crítico deu-se durante a filmagem de Aruanda, em janeiro de 1960. Em agosto do mesmo ano foi ao Rio de Janeiro para a montagem do filme.
Em outubro de 1952 Linduarte surgia nas páginas de A União como dirigente do Cineclube Paraíba, criado exclusivamente para tentar trazer Alberto Cavalcanti (1897-1982) a João Pessoa. Envolvido na produção de O Canto do Mar no Recife, Cavalcanti não foi a Paraíba.
“Figura misteriosa, mítica”. Assim Linduarte sintetiza, em entrevista concedida em 1988, a importância de Alberto Cavalcanti para o cinema brasileiro da década de 1950.
A realização de O Canto do Mar no Recife, a temática regionalista do filme, a publicação do livro Filme e Realidade e o retorno de Cavalcanti à Europa mereceram registros variados na coluna de Linduarte.
Ao reclamar do atraso na exibição de O Canto do Mar em João Pessoa, Linduarte defendia Cavalcanti das eventuais falhas do filme:
“Há três anos Alberto Cavalcanti andou em Recife fazendo um filme. Foi uma reviravolta no ambiente artístico da capital pernambucana; todo mundo queria ser o ator principal da produção dirigida pelo grande cineasta brasileiro que se fez na Europa. Terminada a escolha, o elemento do rádio predominou no elenco, tristemente. (…) O filme não saiu uma obra-prima, como era de se esperar, nem poderia sair. O elemento humano fora ruim, abaixo da exigência do argumento escrito pelo próprio Cavalcanti, nem seu talento de diretor poderia fazer milagres.” (UN, 14/dez/56, p. 2)
No texto dedicado a O Canto do Mar Linduarte enfatiza a superioridade de Cavalcanti no cenário cinematográfico brasileiro. Como de hábito, o título do artigo toma emprestado o título do filme. Nesse caso, todavia, o colunista estampava logo abaixo do título a advertência: “Não é um filme nacional, é de Alberto Cavalcanti”. Lendo trechos do artigo de Linduarte a frase pode até ser interpretada como uma alusão à dificuldade de Cavalcanti em realizar seus projetos no país com uma linguagem brasileira, destituindo assim o filme de qualidades nacionais. Mas o certo é que Linduarte ressaltava a preocupação com o “real”, pouco explorado pelo cinema brasileiro daquele período:
“Cavalcanti não encontrou qualidades humanas para o argumento de seu filme.(…) Infelizmente a ficção não convenceu e a história marcha paralela ao real, como óleo na água, não havendo conexão em nenhuma parte. Mas quando surge o ambiente, o real sociológico, a grandeza do cineasta resplandece. (…) Mas Cavalcanti estava sem tempo, queria sintetizar o mundo fabuloso do folclore nordestino, tendo quebrado assim o princípio que preconiza, de uniformizar a preferência, isto é, um em vez de vários.” (UN, 08/fev/57, p. 2)
Real sociológico que o crítico e jornalista encontra no sertão paraibano, enfatizando-o na reportagem As Oleiras do Olho D’água da Serra do Talhado, publicado em duas partes em A União (20 e 27 de agosto de 1957). Texto e fotos são de Linduarte. A reportagem será a espinha dorsal do roteiro de Aruanda.
Ainda no texto sobre O Canto do Mar é evidente a relação do filme pernambucano de Cavalcanti com o que se verá em Aruanda:
“O argumento simples e humano chocou a opinião dos alheios à outra face da vida. A história da velha lavadeira e sua miséria progressiva abalou aqueles que pensavam encontrar no filme de Cavalcanti um folhetim açucarado, de personagens hollywoodescas e falsetes, quando ele foi procurar na massa os heróis anônimos dilacerados pelas circunstâncias.” (UN, 08/fev/57, p. 2)
O canto da terra seca de Aruanda tem como fonte de inspiração, a se tomar como referência os textos do crítico Linduarte, O Canto do Mar. Em 1960, já longe do Brasil, Alberto Cavalcanti é presença importante na construção de um marco do cinema brasileiro.
Bibliografia
- ARAÚJO, Luciana. A crônica de cinema no Recife dos anos 50. Recife: FUNDARPE, 1997.
CARVALHO, Vladimir. Jornal de Cinema. São Paulo: É Tudo Verdade. Festival Internacional de Documentários, 2015.
CAVALCANTI, Alberto. Filme e realidade. Rio de Janeiro: Casa do Estudante do Brasil, 1957.
DUARTE, B. J. Caçadores de imagens – nas trilhas do cinema brasileiro. São Paulo: Massao Ohno/Roswitha Kempf, 1982.
FALCONE, Fernando Trevas. A Crítica Paraibana e o Cinema Brasileiro – Anos 50/60. São Paulo, dissertação de mestrado apresentada à ECA-USP, 1995.
GALVÃO, Maria Rita. Burguesia e cinema: o caso Vera Cruz. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1981.
GOMES, João de Lima. Terra Distante. João Pessoa: Editora da UFPB: 2014.
MARINHO, José. Dos homens e das pedras: o ciclo do cinema documentário paraibano(1959-1979). Niterói: EdUFF, 1998.
PELIZZARI, Lorenzo & VALENTINETTI, CLAUDIO M. Alberto Cavalcanti. São Paulo: Instituto Lina Bo e P.M. Bardi, 1995.