Ficha do Proponente
Proponente
- Marco Túlio de Sousa Ulhôa (UFF)
Minicurrículo
- Doutorando do Programa de Pós-graduação em Comunicação da Universidade Federal Fluminense, na linha de pesquisa de Estudos de Cinema e Audiovisual.
Ficha do Trabalho
Título
- O filme-ensaio como acontecimento em Ex-Isto de Cao Guimarães
Seminário
- Interseções Cinema e Arte
Resumo
- O artigo analisa o filme Ex-Isto, do cineasta e artista-plástico Cao Guimarães, a partir de suas aproximações com o filme-ensaio, conforme os estudos de Timothy Corrigan. Relacionando o legado literário e a abrangência filosófica como elementos imprescindíveis ao ensaio cinematográfico, o texto aborda o romance que embasa a realização do filme, estabelecendo os aspectos que permitem que este seja apontado como um “acontecimento”, em analogia à maneira como Deleuze e Guattari definem a filosofia.
Resumo expandido
- No livro, O filme-ensaio: desde Montaigne e depois de Marker, o pesquisador Timothy Corrigan destaca os elementos narrativos e representativos do filme-ensaio, atribuindo à origem do conceito, os aspectos decorrentes do interesse da geração de cineastas conhecida como a Rive Gauche da Nouvelle Vague francesa, em promover ligações interdisciplinares do cinema com a literatura e as outras artes. Na perspectiva de Corrigan, o marco fundamental do filme-ensaio moderno representado pela interpretação lançada por André Bazin em torno de Carta da Sibéria (Lettre de Sibérie, 1959), de Chris Marker; seguida pela produção de diretores como Alain Resnais, Agnès Varda e Georges Franju; remonta aos primórdios da prática ensaística que encontra, na literatura de Michel Montaigne, seu modelo precursor. A relação original que liga a escrita ensaística de Montaigne aos procedimentos do ensaio cinematográfico é, ainda, ampliada por Corrigan que projeta a potência formal e a natureza processual do filme-ensaio no campo do debate sobre a experiência e as indagações fenomenológicas que aproximam o cinema e a filosofia, como eixos de uma estrutura dinâmica produtora de ideias e pensamento.
O legado literário que faz do filme Ex-Isto (2010), do cineasta e artista-plástico Cao Guimarães, uma livre-adaptação do “romance-ideia”, Catatau (1975), de Paulo Leminski, associado às interseções filosóficas produzidas tanto pela escrita ensaística Leminski, quanto pelas relações temáticas e especulativas que associam a obra à filosofia de René Descartes, são pontos de uma abordagem que almeja aproximar o longa-metragem do diretor mineiro, dos elementos que caracterizam o filme-ensaio e sua amplitude conceitual diante da expansão da experiência cinematográfica e das suas possíveis relações com o campo das artes. Para isso, a apropriação da hipótese central do romance experimental de Leminski, pela forma como Cao Guimarães propõe a viagem anacrônica de Descartes ao norte e nordeste do Brasil, traduzindo-a cinematograficamente em uma mise-en-scène marcada, basicamente, pelo baile performático entre a câmera e a representação do filosofo francês, estrutura a ação narrativa do filme, ao mesmo tempo que, de acordo com a leitura de Corrigan, esboça a maneira crítica como o filme-ensaio se apropria da literatura: “as adaptações remodelam, distorcem, condensam, ampliam e reposicionam textos literários não como objetos de comentário fiel, mas como o foco de testes críticos e, concomitantemente, testes do próprio fílmico” (CORRIGAN, 2015, p. 189)
A consonância produzida, portanto, entre os elementos que marcam a tradução dos fatos estéticos do romance de Paulo Leminski e a maneira como o espaço-tempo cinematográfico de Ex-Isto é produzido de modo a ampliar a sua tradição cultural e literária; tão bem apontada pela crítica de Haroldo de Campos; determinam a análise em questão que, amparada pela forma Gilles Deleuze e Félix Guattari examinam a produção conceitual a nível pré-filosófico de modo a definir a filosofia como um “acontecimento”, propõe que o caráter ensaístico do filme de Cao Guimarães seja considerado pela chave do acontecimento que marca tanto a sua representação dramatúrgica quanto a sua leitura estética. Dessa maneira, é possível ampliar as intepretações de Timothy Corrigan em torno do filme-ensaio, pensando a forma como o filme analisado reitera alguns dos pontos levantados por suas análises, consecutivamente, interrogando-as do ponto vista artístico e, principalmente, cultural.
Bibliografia
- CAMPOS, Haroldo de. O sequestro do Barroco na Formação da literatura brasileira: o caso Gregório de Matos. São Paulo: Iluminuras, 2011.
CORRIGAN, Timothy. O filme-ensaio: desde Montaigne e depois de Marker. Tradução Luís Carlos Borges. Campinas, SP: Papirus, 2015.
DELEUZE, Gilles; GUATTARI, Félix. O que é a filosofia? Tradução Bento Prado Jr. e Alberto Alonso Munõz. São Paulo: Editora 34, 2010.
DESCARTES, René. Discurso sobre o método. Tradução Paulo M. de Oliveira. Bauru, SP: EDIPRO, 2ª ed., 2006.
LEMINSKI, Paulo. Catatau: um romance-ideia. São Paulo: Iluminuras, 2010.
MICHAUD, Philippe-Alain. Filme: por uma teoria expandida do cinema. Tradução Vera Ribeiro. 1 ed. Rio de Janeiro: Contraponto, 2014.
MONTAIGNE, Michel. Os ensaios: uma seleção. Organização M. A. Screech; tradução Rosa Freire d’Aguiar. São Paulo: Companhia das Letras, 2010.