Ficha do Proponente
Proponente
- Rodrigo Faustini dos Santos (ECA/USP)
Minicurrículo
- Rodrigo Faustini dos Santos é mestrando do programa de Meios e Processos Audiovisuais pela ECA/USP (pós graduação) e possui bacharelado em Midialogia pela Unicamp. Também atua como roteirista, editor e diretor em filmes de curta-metragem, com experiência em animação, ficção, documentários e vídeo experimental. Seus trabalhos artísticos e pesquisa focam-se nas questões da materialidade no cinema analógico e digital.
Ficha do Trabalho
Título
- O cinema bruto de Birgit e Wilhelm Hein: rumo ao Paracinema
Seminário
- Interseções Cinema e Arte
Resumo
- A partir de uma análise do filme “Rohfilm” de Wilhelm e Birgit Hein, será discutida certa prática de cinema materialista da década de 1970 que projeta-se rumo ao Paracinema e à performance, apontada por Jonathan Walley. O filme será discutido como um filme de atrito entre superfícies, de um cinema reflexivo sobre novos estatutos de produção e consumo de imagens sob a emergência do vídeo, a partir de discussões trazidas por Le Grice e os próprios cineastas sobre a materialidade cinematográfica.
Resumo expandido
- A partir de uma análise do filme “Rohfilm” de Wilhelm e Birgit Hein, pretende-se discutir certa prática de cinema materialista da década de 1960 que projeta-se rumo ao Paracinema e à performance. Trajetória esta que, como traçada por Jonathan Walley em seus textos sobre a vanguarda da época, diz respeito a um cinema que torna-se consciente da limitação contraditória da prática cinematográfica formal a um cinema abstrato e reificado, levando suas vertentes mais radicais, então, a tomar o próprio momento da projeção de cinema como evento materialista, aprofundando processos de desmistificação do efeito-cinema. Mais do que a promessa de uma experiência fílmica pura, sugerida pelo título “Filme cru”, “Rohfilm” será discutido como um filme de atrito entre superfícies, de um cinema reflexivo sobre novos estatutos de produção e consumo de imagens sob a emergência do vídeo, a partir de discussões trazidas por Malcolm Le Grice e os próprios cineastas acerca da materialidade no cinema, agressivamente evocada nessa obra que mescla técnicas, materiais, telas e suportes (incluindo o vídeo), enfatizando a instabilidade, fragmentação e sensibilidade da película cinematográfica e sua emulsão fotoquímica através de procedimentos de sua disrupção física (LE GRICE, 1977).
O projeto deste cinema que torna visível seu próprio fazer, tal qual reivindicado por cineastas como os Heins, encontra-se necessariamente num jogo de oscilações e limites entre uma postura anti-ilusionista, de manipulação direta da matéria cinematográfica, mas que ainda simula e representa o funcionamento do aparato cinematográfico ao submeter seu conteúdo a uma forma final banal, de um filme estável em película para projeção – que privilegia o próprio potencial do aparato para o espetáculo ilusório. Tal dualidade é própria da matéria do cinema, como destaca Peter Wollen: “the problem of materialism is inseparable from the problem of signification, that it begins with the problem of the material in and of signification, the way in which this material plays the dual role of substrate and signifler.” (WOLLEN, 1976, p.23).
Se os Heins buscam em seu filme “uma impressão de destruição massiva” (HEIN, 1979, p.96) mas que ainda é estável e reprodutível, foi no campo entrópico e irreprodutível da performance, em trabalhos de artistas como Annabel Nicolson e Tony Conrad, onde essa destruição do fotograma concretizou-se como evento, tornando cada performance única e auto-referente – em seu artigo para o catálogo Film as Film, Birgit Hein mapeia tal prática de cinema-por-seus-próprios-termos, preocupada em enfatizar as mediações ópticas, químicas e mecânicas do aparato cinematográfico, estressados pela vanguarda até atingirem um ponto crítico no qual o Cinema não seria mais limitado à reprodução fotográfica nem a uma só tela, por vezes dispensando da tela como um todo e saindo da sala de cinema para novos espaços, tensionando suas fronteiras – “the medium is, in short, being explored as a visual system” (HEIN, 1979, p.93); obras que se aproximam, assim, do Paracinema descrito por J. Walley como “an array of phenomena that are considered ‘cinematic’ but that are not embodied in the materials of film as traditionally defined.” (WALLEY, 2003, p.16), ao qual diversos desses cineastas (Tony Conrad, Le Grice e os Heins) voltaram suas práticas ao final da década de 1970.
“The intense scrutiny that film underwent at the hands of the avant-garde suggests an attempt to return to a sort of ‘film degree zero’ or ‘pure film.’ But inevitably this project reached a crisis point …” (WALLEY, 2003, p.18): Rohfilm, que hibridiza elementos cinematográficos e não-cinematográficos e tangencia à performance, pode ser posicionado no limite dessa crise da imagem fotográfica presente no cinema materialista, particular por sua ênfase na desintegração da película – lugar que merece atenção no atual momento da cisão entre Cinema e Filme trazida pelo digital, que retoma questões da (i)materialidade no cinema.
Bibliografia
- LE GRICE, Malcolm. Abstract Film and Beyond. EUA: MIT Press, 1977. 160p.
WALLEY, Jonathan. The Material of Film and the Idea of Cinema: Contrasting Practices in Sixties and Seventies Avant-Garde Film. October, EUA, nº 103, pp15-30, Inverno 2003.
WOLLEN, Peter. ‘Ontology’ and ‘Materialism’ in Film.’. Screen, Inglaterra, vol. 17, nº1, pp7-25, 1976.
HEIN, Birgit. The Structural Film. In: HAYWARD GALLERY (Org.). Film as Film. Inglaterra: Arts Council of Great Britain, 1979, pp93-106.
FILMOGRAFIA
ROHFILM. Direção: Birgit e Wilhelm Hein. Produção: Birgit e Wilhelm Hein. Distribuidora: Edition Filmmuseum. 1968. (20min). P&B.