Ficha do Proponente
Proponente
- RAFAEL ROSINATO VALLES (PUCRS)
Minicurrículo
- Doutorando do Programa de Pós-Graduação em Comunicação Social (PPGCOM), da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUCRS). Bolsista CAPES. Mestre em Cinema Documentário pela Fundación Universidad del Cine (Argentina). Integrante do Grupo de Pesquisa Kinepoliticom (CNPq) e Coordenador do Grupo de Estudos Cinesofia (PPGCOM-PUCRS). Documentarista, pesquisador e docente no âmbito do cinema documentário e cinema ensaio.
Ficha do Trabalho
Título
- PENSAR O CONFINAMENTO DA PALAVRA NA OBRA DE JONAS MEKAS
Seminário
- Cinema e literatura, palavra e imagem
Resumo
- Este trabalho pretende analisar como a questão da palavra se insere na obra de Jonas Mekas. O estudo buscará assumir um recorte conceitual sobre a ideia de “confinamento da palavra”, que ocorre basicamente em três dos seus trabalhos: o diário de exílio, os filmes “The Brig” e “As I Was Moving Ahead”. Partindo do pressuposto de que nestes trabalhos se constroem diferentes perspectivas sobre uma ideia de reclusão, acaba-se estabelecendo assim um paradoxo: diante do confinamento, a palavra liberta.
Resumo expandido
- Pensar a questão da palavra na obra do escritor e cineasta Jonas Mekas, possibilita diversos recortes temáticos e conceituais. É um campo fértil analisar a sua obra literária desde os seus poemas, passando pela crítica cinematográfica, até a sua escrita em forma de diário. Quando a palavra se insere na sua obra cinematográfica, é igualmente interessante refletir sobre como ela assume protagonismo dentro do processo de construção imagética que o realizador efetua nos seus filmes-diário.
No entanto, o objetivo deste trabalho é assumir um recorte mais conceitual, sobre como o uso da palavra na obra de Jonas Mekas termina estabelecendo vínculos entre trabalhos tão distintos dentro da sua trajetória literária e cinematográfica. É o caso do diário de exílio que Mekas escreveu entre 1944-1945 dentro de um contexto de Segunda Guerra Mundial; o filme “The brig” (1964), registro documental feito por Mekas sobre uma peça com o mesmo nome, escrita por Kenneth Brown e apresentada em 1963 pelo The Living Theater; o filme-diário “As I Was Moving Ahead Occasionally I Saw Brief Glimpses of Beauty” (2000).
Estes três trabalhos possuem como ponto em comum a questão do confinamento. Mekas começou a escrever o seu diário de exílio a partir do momento em que teve que fugir da sua terra natal (Lituania), até ser preso pelos nazistas e ficar confinado nos campos de concentração. É no confinamento também que se constrói “The Brig”, onde o filme relata, através da peça de teatro, a rotina de uma prisão militar da marinha norte-americana e as condições de submissão e trabalhos forçados pelo qual soldados foram condenados. Já sem o contexto de uma prisão, mas ainda assim confinado na sua casa e diante dos seus registros fílmicos, Mekas aguarda a virada do século rememorando sobre a moviola momentos da sua vida, no filme-diário “As I Was Moving Ahead…”.
É a partir destas diferentes formas de confinamento que a questão da palavra assume protagonismo na construção destas obras. É diante deste confinamento que a palavra o liberta. Se Mekas necessitou realizar trabalhos forçados enquanto esteve preso nos campos de concentração, foi na escrita do seu diário que ele encontrou uma forma de libertar-se da sua condição de prisioneiro. “Vocês criaram esta civilização, estas fronteiras e estas guerras, eu não posso nem quero entendê-los… Sou livre inclusive nas suas guerras” (MEKAS, 2008, p.50).
Em “The Brig”, no texto original representado pelos atores, a palavra é domesticada, desumanizada, os prisioneiros repetem exaustivamente as palavras de ordem dos seus comandantes. Assim como o filme ressalta a mecanização dos sentidos nos prisioneiros, a palavra também se torna uma construção de poder que padroniza os seus comportamentos. É justamente neste confinamento da palavra que The Brig assume não somente um caráter de denúncia, como também propõe uma nova forma para refletir sobre o uso da palavra. Áspera e objetiva, a palavra incomoda, intima uma reflexão sobre a própria imagem e a representação cinematográfica.
Em “As I Was Moving Ahead…”, confinado na sua casa, diante da sua moviola e materiais de arquivo, Mekas intima o espectador a participar do processo de construção do próprio filme, procurando torná-lo seu próprio confidente. “Meus queridos espectadores, chegamos a capítulo 4. Me perdoem: nada, nada extraordinário até agora aconteceu neste filme”, afirma Mekas, com o uso da voz em off. A palavra o liberta do seu isolamento, convoca a uma interação imaginária de Mekas com o espectador.
É diante da ideia de confinamento que Mekas estabelece distintas relações com a palavra, construindo formas de significação que confrontam tanto a um contexto histórico, como também ao próprio campo simbólico das imagens. Na sua obra, a palavra assume um protagonismo que a impede de ser uma mera reprodução ou complementação do que pode ser mostrado em imagens. Confinada, a palavra constrói novos sentidos que a libertam do seu próprio confinamento.
Bibliografia
- COMOLLI, Jean Louis (2007), “Prisiones de la mirada”. em Jean Louis Comolli. Ver y poder – La inocencia perdida: cine televisión, ficción, documental, Aurelia Rivera, Buenos Aires.
DIDI-HUBERMAN, Georges. Imagens apesar de tudo. Lisboa-Portugal: Imago, 2012.
MEKAS, Jonas. Diario de cine – El nacimiento del nuevo cine norteamericano. México: Mangos de Hacha, 2013.
_____________ Ningún lugar adonde ir. Buenos Aires: Caja Negra Editora, 2008.
_____________, MOURÃO, Patricia (org.). Jonas Mekas. São Paulo: Centro Cultural Banco do Brasil; Pró-Reitoria de Cultura e Extensão Universitária – USP, 2013.
VEIGA, Roberta. A estética do confinamento – o dispositivo no cinema contemporâneo. Belo horizonte: UFMG, 2008, 261 f. Tese (Doutorado em Comunicacão) – Programa de Pós-Graduação em Comunicação e Sociabilidade Contemporânea, Faculdade de Filosofia e Ciências Humanas, Universidade Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte, 2008.