Ficha do Proponente
Proponente
- Márcia Bessa (Márcia C. S. Sousa) (FBN/RJ)
Minicurrículo
- Márcia Bessa é doutora em Memória Social (PPGMS/UNIRIO e DCMS/UChicago) e mestre em Ciência da Arte e cineasta (ambos pelo IACS/UFF). Desde 1993, atua nas áreas de Produção cultural, Audiovisual, Educação superior e Pesquisa científica. É membro-pesquisador de grupos de pesquisa CNPq na UFRJ e ESPM-Rio. É sócia-diretora da MP2 Produções Ltda. Atualmente realiza residência na Fundação Biblioteca Nacional (PNAP-R/FBN) e integra o Coletivo artístico DUO2X4.
Ficha do Trabalho
Título
- Se esse cinema (de rua) fosse meu…
Seminário
- Exibição cinematográfica, espectatorialidade e artes da projeção no Brasil
Resumo
- Vivemos um momento em que ainda existem alguns exemplares dos tradicionais cinemas de rua para serem reconhecidos na paisagem urbana carioca. O presente trabalho apresenta um estudo sistemático das salas de exibição cinematográfica que ainda operam comercialmente em calçadas do Rio de Janeiro e tenta problematizar os impactos dessa sobrevida no circuito exibidor, na frequentação e na (re)ocupação do espaço público compartilhado.
Resumo expandido
- A cidade do Rio de Janeiro já somou mais de 170 (1955) cinemas de rua – “a casa tradicional, aquela instalada em ruas e praças” (GONZAGA, 1996) – funcionando comercialmente em suas calçadas. Hoje, damos conta da existência de somente oito dessas salas de exibição cinematográfica na capital fluminense: CCLSR/Odeon, Roxy, Leblon, Estação Net Botafogo, Estação Net Rio, Espaço Itaú de Cinema, Cine Santa Teresa e CineCarioca Nova Brasília. Conseguiram manter-se vivas nos passeios públicos apesar de fechamentos, reformas e ameaças. Mas o que teria feito alguns desses cinemas permanecerem nas ruas e tantos outros não? O que há de particular nesses casos? O que haveria de singular nessas ruas, nessas comunidades que motivariam tal sobrevida?
O processo de extinção dos cinemas de rua no espaço urbano do Rio de Janeiro convoca e rememora a trajetória cíclica do circuito exibidor nacional. Mas a conjuntura crítica que marcou a época em que os cinemas de rua começaram a desaparecer por aqui não era só mais uma crise, era uma crise estrutural. A partir dos anos 1980, o parque exibidor brasileiro sofreria a maior modificação desde seus primórdios: a substituição por salas em shopping centers. Nada poderia prever que os cinemas sairiam das ruas. Nesse processo desaparece não somente o edifício, mas também uma experiência fortemente marcada pelo espaço público compartilhado e pela arquitetura do cinema que definem rituais específicos. Em 1995, tínhamos um pouco menos da metade daquele montante. Em fins dos anos 1990, com a disseminação dos tais centros de compras, o número de salas de exibição cresceu; porém, esse crescimento se deu de forma escassa e concentrada. As faixas menos favorecidas de nossa população ou foram excluídas do universo do cinema ou permanecem sendo mal atendidas: as periferias urbanas e comunidades carentes.
Alguns têm falado num movimento de retorno dos cinemas de rua na cidade. Esse fôlego parece estar vindo das novas reestruturações urbanas de um Rio de Janeiro que recebe grandes eventos mundiais e que enseja ainda um aumento da circulação (e permanência) de pessoas nas atividades citadinas. Mas a prefeitura carioca – que anunciou (em 2012) um programa de recuperação de cinco cinemas de rua na Zona Norte – mantém esse mesmo projeto em suspenso há mais de dois anos. Enquanto isso, o empresário Omar Peres parece já ter desistido de inaugurar novo Rian no Leme. A maior parte dos cinemas de rua foi vendida e adquiriu novos usos. Algumas poucas salas ainda permanecem fechadas aguardando seu destino incerto. Em número infinitamente mais reduzido temos edifícios que figuram dentre os cinemas erótico-pornográficos; provando que é cada vez mais difícil a comunhão entre rua e cinema. Esses planos de retorno têm deixado clara a intenção de que essa iniciativa seria viabilizada notadamente através da transformação desses espaços em centros de cultura e lazer. O regime de funcionamento dos antigos cinemas de rua cariocas – sobretudo no que concerne à exclusividade do produto cinematográfico tradicional e à operação em sala única – não parece apresentar viabilidade socioeconômica na contemporaneidade. O modelo de ex-cinema de rua/negócio cultural/centro cultural/disposição multissalas tem sido a aposta do momento.
Às particularidades, heterogeneidades e urbanidades dos antigos cinemas de rua opõe-se a linearidade, massificação e confinamento de grande parte da exibição comercial contemporânea. Não se trata aqui de negativizar a existência dos shopping centers e seus multiplexes, mas sim de pensar num projeto de ação que permeie discussões e iniciativas que privilegiem a convivência de diferentes formatos de exibição cinematográfica no âmbito da cidade. A ideia é ainda poder manter uma experiência diversa, repleta de nuances, charme e glamour não vistos nas salas de exibição dos centros comerciais. É poder continuar a experimentar a vivência de um tempo, de uma sociedade e de uma cidade específicos.
Bibliografia
- ALMEIDA, Paulo S.; BUTCHER, Pedro. Cinema, desenvolvimento e mercado. Rio de Janeiro: Aeroplano, 2003.
CINEMAS, Nº 47, agosto, 1986. In: ___. Filme Cultura: edição fac-similar 43-48. Rio de Janeiro: Ministério da Cultura, CTAv, 2010. p. 433-564.
COSTA, Renato Gama-Rosa. Salas de cinema Art Deco do Rio de Janeiro. Rio de Janeiro: Editora Apicuri, 2012.
GONZAGA, Alice. Palácios e poeiras: 100 anos de cinema no Rio de Janeiro. Rio de Janeiro: Record, 1996.
LUCA, L. G. A. O futuro do cinema. Filme Cultura – Vanguarda e inovação, n. 54, maio/2011, p. 19-22. 2011.
SOUSA, Márcia C. S. (Márcia Bessa). Sobrevivendo no asfalto: por uma memória social dos cinemas de rua em processo de extinção nas calçadas cariocas. Projeto de pesquisa. PNAP-R/FBN (2014-2016).
VIEIRA. João Luiz; PEREIRA, Margareth C. S. Espaços do sonho: cinema e arquitetura dos cinemas no Rio de Janeiro 1920-1950 – [Pesquisa para Embrafilme/Cinetema]. Rio de Janeiro, 1982.