Trabalhos Aprovados 2016

Ficha do Proponente

Proponente

    Maria Cristina Mendes (UEPG)

Minicurrículo

    Professora Adjunta do Departamento de Artes da UEPG/PR (desde 2015) e professora dos cursos de Artes Visuais e Tecnologia em Fotografia da UTP/PR (2002 a 2015). Doutorado (2014) e Mestrado (2010) em Comunicação e Linguagens na UTP/PR; Especialização em História da Arte do Século XX (2000) na EMPAP/PR e Graduação em Pintura (1984) na EMBAP/PR. Coordenadora do curso de Especialização – Fotografia: processos de produção de imagens na UTP/PR (2012 a 2015).

Ficha do Trabalho

Título

    Adaptação Neobarroca: Catatau de Leminski e ExIsto de Cao Guimarães

Resumo

    ExIsto (Cao Guimarães, 2010) é uma adaptação cinematográfica de Catatau ( Paulo Leminski, 1975). Analiso nos trechos do filme, Dança da chuva, Brasília e Mãe Preta, a presença do Barroco que Haroldo de Campos identifica no livro e aponto mudanças socioculturais no período que separa as obras. Se tradução criativa e infidelidade ao texto fonte fundamentam a qualidade da nova obra, destaco singularidades do estilo que, para Deleuze, representa novo modelo de mundo.

Resumo expandido

    Em 1975 Paulo Leminski publica Catatau e em 2010 Cao Guimarães lança o longa-metragem ExIsto, uma adaptação livre do romance. Em setembro de 1989, ano da morte do poeta paranaense, Haroldo de Campos publica “Uma Leminskíada Barrocodélica”, ensaio que destaca o alto grau de ilegibilidade e o caráter polissêmico do texto, cujo tema é a fictícia vinda de René Descartes para o Brasil e a desconstrução do método cartesiano. Investigo, no livro e no filme, a presença de características Neobarrocas e destaco algumas de suas singularidades. Dada a premissa que os processos intersemióticos, tais como adaptações ou apropriações, podem evidenciar a transformação de mundos, pesquiso como ExIsto pode indicar algumas das substanciais alterações sociais ocorridas nos trinta e cinco anos que separam as duas obras. Adoto o método crítico analítico de caráter intertextual, com base em Décio Pignatari, Haroldo de Campos e Júlio Plaza, que valorizam a tradução criativa. A partir do conceito de “cinema impuro” de André Bazin, enfatizo os postulados de Robert Stam e Julie Sanders sobre as teorias de adaptação cinematográfica, cujo ponto em comum é a desvalorização da fidelidade ao texto fonte e o enaltecimento das peculiaridades de cada linguagem. Com aporte em Ernst Gombrich, Heinrich Wölfflin e Gilles Deleuze delimito peculiaridades dos estilos artísticos, evidenciando as substanciais alterações imagéticas provindas do predomínio da racionalidade no Renascimento e da exasperação da emoção no Barroco. Explicito características Neobarrocas em Catatau com bases em Haroldo de Campos e analiso três fragmentos de ExIsto nos quais a retomada do estilo é evidente. Em Dança da chuva demonstro a preocupação com os limites da linguagem e a potência dos efeitos tecnológicos; em Brasília enfatizo a serialização das imagens quase estáticas e a ausência de foco; em Mãe Preta valorizo a tonalidade castanha da cena e a retomada do sagrado. Pontuo singularidades em cada uma das obras, lembrando que no livro Descartes devaneia nos jardins de Nassau e no filme conhece rio, floresta, cidade e mar. Se o romance é repleto de personagens históricas em constante imbricação, o filme mostra a solidão de Descartes nos trópicos. Os abismos do livro são intransponíveis e residem na desconstrução de provérbios, na junção de línguas distintas e no deslocamento de letras e sílabas, numa atitude de franca experimentação dos limites da inteligibilidade. A atmosfera do filme é de encantamento: as fronteiras da linguagem visual são ampliadas, os contornos das formas diluídos e os silêncios potencializados através de estratégias típicas das pesquisas poéticas em suportes audiovisuais. A polissemia, os excessos e mestiçagens de Catatau se associam, em ExIsto, aos êxtases de Descartes, ao foco da imagem e à montagem fílmica. Dentre as singularidades que evidenciam possíveis alterações socioculturais destaco a atual problemática de movimentos contraculturais e a multiplicidade de possíveis abordagens sociológicas decorrentes da ampliação dos processos comunicacionais. As neobarroquizações criam brechas de expressividade, locais por onde as formas artísticas se inscrevem no mundo. O filme de Cao Guimarães mantém o caráter enigmático que identifica a produção literária leminskiana; ao traduzir criativamente o romance, Existo instaura um modo peculiar de estar no mundo, quando pensar e sentir estabelecem relações dialéticas. Descartes, no século XXI, transcende fronteiras geográficas e linguísticas em curvas e dobras Neobarrocas. Num mundo em que proliferam os processos de comunicação, Descartes silencia.

Bibliografia

    BAZIN, A. O que é o cinema? SP: Cosac Naify, 2014
    CAMPOS, H. Transluciferação. In: PLAZA, J (org.) Transcriar. SP: MAC/USP, 1985, p.5-8
    DELEUZE, G. A Dobra: Leibniz e o Barroco. Campinas: Papirus, 2012
    GUIMARÃES, C. ExIsto. DVD, 86 min. Dig. Cor. Brasil, 2010
    HUTCHEON, L. A Theory of Adaptation. New York/London: Routledge, 2006
    LEMINSKI, P. Catatau – um romance idéia. SP: Iluminuras, 2013
    LINS, C. Ex-isto: Descartes como figura estética do cinema de Cao Guimarães. In: GONÇALVES, O (org). Narrativas Sensoriais: ensaios sobre cinema e arte contemporânea. RJ: Circuito, 2014, p. 83-102
    PIGNATARI, D. Semiótica da Arte e da Arquitetura. SP: Cultrix, 1981
    PLAZA, J. Tradução Intersemiótica. SP: Perspectiva, 2008
    SANDERS, J. Adaptation and Appropriation. New York/London: Routledge, 2008
    STAM, R. A literatura através do cinema: realismo, magia e a arte da adaptação. BH: UFMG, 2008
    WÖLFFLIN, H. Conceitos fundamentais da história da arte: o problema do estilo na arte