Ficha do Proponente
Proponente
- Sandra Fischer (UTP)
Minicurrículo
- Pós-doutora em Cinema (Escola de Comunicação da Universidade Federal do Rio de Janeiro/ECO-UFRJ, 2009); doutora em Ciências da Comunicação (Escola de Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo/ECA-USP, 2002). Docente e pesquisadora do Programa de Pós-Graduação em Comunicação e Linguagens da Universidade Tuiuti do Paraná (UTP); coordenadora da Linha de Pesquisa “Estudos de Cinema e Audiovisual”.
Ficha do Trabalho
Título
- O ESTRANHO NO COTIDIANO: LUGAR E DESLOCAMENTO NO CINEMA DE MUYLAERT
Resumo
- A comunicação ocupa-se do cinema da diretora brasileira Anna Muylaert, focando prioritariamente dois de seus filmes: “Durval discos” (2002) e “Que horas ela volta?” (2015). O objetivo é propor uma reflexão a respeito da potência subversiva – essa é nossa hipótese – que se aloja nas imagens do estranho que, subitamente, emerge em meio à banalidade cotidiana e instala-se no ambiente fílmico – redefinindo rumos diegéticos e determinando arranjos estéticos.
Resumo expandido
- A comunicação ocupa-se do cinema da diretora brasileira Anna Muylaert, focando prioritariamente dois de seus filmes: “Durval discos” (2002) e “Que horas ela volta?” (2015). O objetivo é propor uma reflexão a respeito da peculiar potência subversiva – essa é nossa hipótese – que se aloja nas imagens do estranho que, subitamente, emerge em meio à banalidade cotidiana e instala-se no ambiente fílmico – redefinindo os rumos diegéticos, determinando os arranjos estéticos e subvertendo expectativas. A filmografia da cineasta brasileira Anna Muylaert, marcada por obras que primam pela mistura de gêneros que se alternam entre o dramático e o cômico, caracteriza-se, em certa extensão, pela alusão a elementos surrealistas e pela presença da crítica ao caráter claustrofóbico e muitas vezes perverso de determinadas facetas dos sistemas sociais vigentes. Em tramas ambientadas em cenários urbanos do Brasil contemporâneo e desenvolvidas no espaço e no tempo de cotidianidades cujo semblante exibe a face ‘esquisita’ do ordinário e do banal, personagens aparentemente comuns e figuras de caráter metafórico movimentam-se por entre as veredas da comédia ligeira, do suspense leve, do drama corriqueiro de onde subitamente emergem o estranho e o surreal. Estranho, ressalte-se, na perspectiva em que o termo é definido por Sigmund Freud (1996), segundo o qual o estranho é entendido como “aquela categoria do assustador que remete ao que conhecido, de velho, e há muito familiar”; e surreal, entenda-se, em muito calcado nos moldes de Luis Buñuel. Em “Durval Discos” e em “Que horas ela volta?”, o advento inesperado e invasivo da chegada do estrangeiro na cena cotidiana de agrupamentos familiares e sociais – solidamente constituídos, firmemente enlaçados, autocentrados e enredados em normas e convenções cristalizadas porque nunca antes questionadas – desarranja a ordenação do status quo e revela, de forma lenta mas inexorável, os movimentos que perfazem a coreografia perversa do sufocamento e da segregação. O estranhamento inevitável, atrelado ao incontornável desconforto que provoca, desnuda o nonsense e o absurdo implícito em regras que, tácita e silenciosamente, regem, modalizam e regulam a rotina das pessoas e o curso dos acontecimentos – sem que necessariamente os envolvidos se deem efetiva conta dos diversos mecanismos de coerção e segregação implicados nesse processo. De maneira delicada e sutil – ludicamente, por vezes –, e sempre desprovida de qualquer alarde panfletário, os recortes temáticos e os recursos expressivos que perfazem o universo da obra da diretora não apenas apresentam a artificialidade e o anacronismo de determinadas bases que estruturam lugares e posicionamentos em relações familiares e sociais que subsistem e resistem articuladas por meio de mecanismos tacitamente consentidos e mesmo incentivados de controle e exploração, segregação e exclusão, como sediam a crítica e o debate a respeito das condições de produção e funcionamento desses sistemas e suas concernentes implicações e desdobramentos.
Bibliografia
- DELEUZE, G. Lógica do sentido. São Paulo: Perspectiva, 1998.
DELEUZE, G. A imagem-tempo. São Paulo: Brasiliense, 1990.
FISCHER, S. “’Durval discos’: cinema e estranhamento”. (In: CATANI, A. et al [Orgs]. Estudos Socine de cinema, ano VI). São Paulo: Nojosa Edições, 2005, pp. 285-292.
FREUD, S. “O estranho” (In: Obras psicológicas completas de Sigmund Freud.) Rio de Janeiro: Imago, 1996.
FREYRE, G. Casa grande & senzala – formação da família brasileira sob o regime da economia patriarcal. São Paulo: Global, 2015.
TEIXEIRA, Rafael Tassi. “Paisagens da Crise e Identidades de Abandono no Cinema Brasileiro Contemporâneo”. Revista Científica/FAP(Curitiba. Online), v. 12, p. 263-276, 2015.
VIVEIROS DE CASTRO, Eduardo. “Equívocos da identidade”, (In: GONDAR, J.; DOBEDEI, V. [Orgs]). Rio de Janeiro: ContraCapa, 2005.